DESAFIO UNIVERSITáRIO » A nova matemática do ensino superior privado no Brasil

André Clemente, Rochelli Dantas, Sávio Gabriel e Thatiana Pimentel economia@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 21/07/2018 03:00

Momentos de crise ensinam. Ou, pelo menos, forçam a busca por alternativas e obrigam a repensar estratégias. É assim que as instituições do ensino superior privado brasileiro estão passando pela recessão econômica e pela míngua do Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies). Gestores das faculdades de todo o Brasil estão refazendo os cálculos e precisam sentar novamente nos bancos dessa escola chamada instabilidade para (re) aprender a lição do crescimento sustentável. O segmento que representa 1% de tudo que é produzido no Brasil (Produto Interno Bruto - PIB) e emprega mais de 400 mil pessoas no país hoje tem enfrentado quedas nas matrículas que chegam a 10% (2017) e expectativas de nova redução de 5% neste ano, segundo o Sindicato das Mantenedoras do Ensino Superior (Semesp). Para a maioria das instituições, porém, o cenário é antes de tudo um desafio, uma oportunidade. E quem busca a formação superior tem novas possibilidades no horizonte. O Diario inicia nesta edição o especial Desafio universitário, que detalhará esse cenário até a próxima terça-feira. O material completo estará disponível no http://blogs.diariodepernambuco.com.br/desafiouniversitario

Uma em cada duas vagas nas universidades e faculdades brasileiras está vazia neste momento ou sequer foi ocupada. Esse quadro também é observado em Pernambuco, sétimo lugar no ranking 2018 de ociosidade no Brasil, segundo dados da plataforma Quero Bolsa, que oferta desconto para os estudantes e ajuda as faculdades a preencherem essas vagas.

O cenário começou a ser desenhado com a redução do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), que caiu de 731 mil créditos, em 2014, para 315 mil, já em 2015, e vem sendo reduzido ano a ano. O Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais (Inep) corrobora o fato com dados de 2010 a 2016, que mostram uma variação de vagas ociosas no ensino superior entre 35% e 49% durante o recorte. Esse índice só chegou a 26%, recorde mínimo, em 2014, mesmo ano em que o Fies teve seu ápice de financiamentos.

Além disso, as instituições de ensino superiores privadas enfrentam também os reflexos da crise econômica que atinge o país há cerca de três anos. Fatores que têm obrigado os gestores a estudar os caminhos para retomar o crescimento. Até agora, as soluções passam por financiamentos próprios, ensino à distância, aulas práticas, fusões e o ajuste das demandas com o mercado de trabalho.

Especialistas apontam ainda a formação de redes entre instituições e o crescimento das universidades corporativas como alternativas para o desaquecimento do segmento. O que é claro, porém, é a necessidade de trabalhar para reverter a falta de aproveitamento das vagas disponibilizadas nas instituições de ensino superior privadas do Brasil. De forma mais emergencial, o setor tem que lidar com uma queda de 10% nas matrículas, em 2017, expectativa de queda de 5% neste ano e perspectivas incertas para 2019.

Público-alvo
“O principal desafio dessas instituições é conquistar os jovens brasileiros, um público-alvo de quase três milhões de consumidores, mantendo a qualidade do ensino”, avalia Rodrigo Capelato, economista e diretor do Sindicato das Mantenedoras do Ensino Superior (Semesp). “Apenas 18% dos jovens de 18 anos a 24 anos estão no ensino superior no Brasil. No Plano Nacional da Educação (PNE), produzido pelo Ministério da Educação (MEC), o objetivo é colocar 33% dos jovens brasileiros em uma graduação. Então, existe um público consumidor potencial de dois a três milhões de jovens no Brasil que está fora das faculdades”, afirma.

Nesse ponto, Capelato acredita que o setor precisa se perguntar o motivo que justifica o não ingresso de estudantes no sistema. “Porque 80% desse público não têm oportunidade ou porque ele recebe menos de três salários mínimos e, agora, está fora até do Fies. Tem também muitos jovens que vêm de um ensino básico sem qualidade.”

Pedro Balerine, diretor de inteligência de mercado da Plataforma Quero Bolsa, que busca vagas ociosas e propõe descontos para atrair alunos e preencher o vazio, acrescenta que algumas faculdades tinham 70% dos alunos vinculados ao Fies, como o grupo educacional Kroton, e, com a queda no número de financiamentos, sentiram os reflexos no quantitativo de alunos. Resultado: optaram por enxugar o quadro de funcionários para reduzir o peso dos custos, mas essa solução não foi suficiente. “Muitos demitiram, mas não há possibilidade de reduzir a capacidade instalada. E agora? Não há uma solução única. O caminho vai ser diferente para cada instituição e vai englobar mais de uma opção como financiamentos próprios, bolsas e educação à distância”, opina.

Os financiamentos próprios, porém, não são a solução na opinião de Capelato. “Não resolve de forma sustentável a questão”, argumenta. Já Saumíneo da Silva Nascimento, superintendente-geral do Grupo Tiradentes (Universidade Tiradentes, Facipe, Faculdade São Luís de França e Faculdade de Medicina de Pernambuco), acredita que a mobilização pelo financiamento à educação é uma oportunidade real para transformar o ensino superior no Brasil. “Muitos necessitam estudar, porém as condições de renda desses inviabilizam o acesso à educação privada que complementa com o setor público a oferta de cursos para as demandas da sociedade. Vejo esse momento como a chance dos bancos serem protagonistas e apresentarem um modelo que atenda a esse grande público e ocupe o espaço deixado pelo Fies.”

Dados do Ensino Superior Privado no Brasil

Ano     Vagas Abertas         Vagas Ociosas         Percentual

2010     3.120             1.530             49%
2011     4.453             2.107             47%
2012     4.653             1.906             40%
2013     5.068             2.326             45%
2014     6.345             1.702             26%
2015     6.142             2.362             38%
2016     7.873             2.769             35%

Fonte: INEP

Ranking de ociosidade/2018

RJ                    57,8%
SP                    57,3%
BA                    56,8%
DF                   55,9%
PA                   55,7%
AM                   54,5%
PE                  53,8%
GO                  52,2%
PR                  51,8%
RS                   51,6%
MG                   50,7%
ES                   50,1%
AL                  49,8%
SE                 47,5%
RN                 47,4%
RO                 47,2%
MT                 46%
SC                 44%
CE               43,5%
MS               42,6%
PI              42%
PB              42%
TO           33,7%
MA          31%
AP        26,9%
AC        25%
RR         11,3%
  • Ociosidade em Pernambuco – Cerca de 53,8%
  • Média nacional –––––––––– Cerca de 52,9%
  • Pernambuco é o sétimo estado no ranking de ociosidade brasileiro
  • Ou seja, de cada 10 vagas nas universidades públicas e privadas brasileiras, cinco não estão ocupadas
Cinco cursos com maior número de alunos matriculados:
  • Direito
  • Administração
  • Pedagogia
  • Engenharia civil
  • Ciências contábeis 
  • Juntos, representam 36,72% dos universitários brasileiros
No Recife, o valor médio cobrado em cada um dos cursos no 1o semestre de 2018 é de:
R$ 1.027 para o curso de Direito
R$ 994 para Engenharia Civil
R$ 930 para Administração
R$ 704 para Ciências Contábeis 
R$ 426 para Pedagogia

Fonte: Quero Bolsa

Vagas Ociosas/Processo seletivo
Presencial - Brasil


2013 - 48,7%
2014 - 42,2%
2015 - 53,8%
2016 - 59%

Vagas Ociosas/Processo Seletivo
EAD - Brasil


2013 - 72,2%
2014 - 76,3%
2015 - 73,9%
2016 - 80,5%

Fonte: Semesp

FIES

2010 - 2014:

O fundo cresceu quase 1000% - indo de 76 mil a 732 mil vagas

De 2015 a 2017:
Queda drástica, chegando a apenas 100 mil vagas

De 2010 até 2017:
o orçamento do fundo foi de R$ 82,59 bilhões, com um total de 2,56 milhões de contratos

Veja o número de vagas disponibilizadas pelo Fies nos últimos anos:

2010 - 76,2 mil
2011 - 154,3 mil
2012 - 377,8 mil
2013 - 560 mil
2014 - 731,3 mil
2015 - 315 mil
2016 - 220 mil
2017 - 225 mil
2018 - 300 mil (previsão)

Fonte: FNDE
  • O Plano Nacional de Educação (PNE) estima que, em 2024, 33% da população entre 18 e 24 anos no Brasil esteja matriculada em uma instituição de ensino superior.
  • Atualmente, estamos com 18% dessa população nas universidades.
  • Em 2016, 82,3% das vagas de ensino superior no Brasil estavam nas instituições privadas
Fonte: ABMES