EDUCAçãO » "Tornar o aprendizado relevante"

A produção do conteúdo desta página é coordenada pela psicóloga Michele Almeida

Publicação: 18/05/2019 03:00

Entrevista - Alina Galvão // psicóloga

Possui graduação em psicologia (1978) e mestrado em Psicologia Cognitiva pela Universidade Federal de Pernambuco (1984), doutorado em Psicologia do Desenvolvimento pela University of Oxford, Inglaterra (1990) e pós-doutorado na University of Sussex, Inglaterra (1998). É Professora Titular do Departamento de Psicologia e da Pós-Graduação em Psicologia Cognitiva da Universidade Federal de Pernambuco. Coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Psicologia da Educação Matemática (NUPPEM). Pesquisadora Nível 1 do CNPq, tendo como áreas de pesquisa a Psicologia do Desenvolvimento Cognitivo e da Aprendizagem.

Quais as contribuições da psicologia para a Educação Matemática?
Uma contribuição importante, de natureza geral, é a ideia de que desenvolvimento cognitivo e aprendizagem são relevantes para o ensino, especialmente em relação à matemática. Para se ensinar, dentre outras coisas, é necessário saber como o estudante pensa e compreende os conceitos matemáticos que a escola deseja que ele aprenda. Tendo isso em mente, o ensino passa a considerar as formas de raciocinar do aluno e a tentar identificar as dificuldades que ele enfrenta na aprendizagem desses conceitos. Na realidade, a didática não pode dispensar a contribuição da psicologia, uma vez que as formas de ensinar estão relacionadas a formas de aprender e formas de raciocinar.  Pesquisas no âmbito da Psicologia da Educação Matemática têm contribuído nesta direção. Há estudos que descrevem os diferentes momentos do desenvolvimento em relação à aquisição de um dado conceito matemático; outros permitem identificar fatores que influenciam e possam vir a facilitar a aprendizagem e os fatores que dificultam a compreensão da criança.  Uma das grandes contribuições, na minha opinião, são os estudos de intervenção que, além de esclarecer questões teóricas importantes, têm aplicações práticas. Esses estudos permitem investigar em que o conhecimento sobre o desenvolvimento cognitivo pode contribuir para o ensino e a aprendizagem da matemática e ao mesmo tempo que permitem investigar em que o ensino e a aprendizagem da matemática podem contribuir para desenvolvimento cognitivo. Os resultados dessas pesquisas têm sido considerados em algumas ações educacionais importantes, como por exemplo produção de livros didáticos, programas de avaliação de livros didáticos, elaboração de propostas curriculares e capacitação de professores.

A Psicologia da Educação Matemática é uma área recente? É conhecida apenas no exterior ou também no Brasil?
É antiga e conhecida tanto no exterior como no Brasil. Em 1976, na Alemanha durante um congresso internacional em Educação Matemática, criou-se um grupo de estudos denominado Psicologia da Educação Matemática, que articulava esses três campos do conhecimento com vistas a elaborar reflexões teóricas sobre ensino e aprendizagem da matemática. Além disso, o grupo tinha interesse em estimular pesquisas que permitissem criar situações didáticas que propiciassem o desenvolvimento do conhecimento matemático dos estudantes. Além de interdisciplinar, a Psicologia da Educação Matemática tem um caráter teórico, empírico e aplicado. No Brasil, encontrou terreno fértil em alguns centros de pesquisa e no âmbito de sociedades de abrangência nacional como a ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia), a ANPED (Associação Nacional de Pesquisa em Educação) e a SBEM (Sociedade Brasileira de Educação Matemática). Em Pernambuco, especificamente, em 1996 o Programa de Pós-Graduação em Psicologia Cognitiva da UFPE sediou o 19º Encontro Anual do International Group for the Psychology of Mathematics Education e mantém, desde 2006, o NUPPEM (Núcleo de Pesquisa em Psicologia da Educação Matemática) que, agora em maio, sedia o IV SBPEM (Simpósio Brasileiro de Psicologia da Educação Matemática). Este simpósio que congrega estudiosos de diferentes estados do país e do exterior é uma parceria com a UPE, com a UFRPE e com o EDUMATEC (Pós-Graduação em Educação Matemática e Tecnológica) da UFPE. Esta parceria evidencia que a este campo de estudo interessa a muitas instituições. Pernambuco tem se destacado neste campo do conhecimento, o que muito nos orgulha.

Muito tem se falado sobre tornar significativo o aprendizado do aluno em tempos de transformação na área de educação.  Esse é um dos objetivos da sua proposta. Como alinhar escolas, sociedade e pais para uma aprendizagem que é considerada difícil para maioria dos alunos?
Tornar o aprendizado significativo e relevante para o aluno permite tanto que ele perceba a possibilidade de aplicar o conhecimento escolar a situações extraescolares como também o inverso, ou seja, aplicar o conhecimento matemático adquirido fora da escola às situações de aprendizagem no contexto de sala de aula.  É fundamental que o aluno perceba as relações que existem entre os conhecimentos matemáticos adquiridos em casa, nas ruas, no trabalho, por exemplo, e as atividades matemáticas propostas em sala de aula. Esta articulação é uma via de mão dupla em que o conhecimento matemático adquirido fora da escola participa e influencia a aquisição do conhecimento matemático tratado na escola e vice-versa. Ambos são mutuamente constitutivos. Tanto a escola como a família precisam estar cientes disso, entender que há diversas formas de aquisição do conhecimento matemático. A escola, por sua vez, precisa favorecer a compreensão desta relação por parte dos estudantes e das famílias. Às vezes os professores não sabem que conhecimentos matemáticos seus alunos já trazem para a sala de aula e muitas vezes o próprio aluno não percebe que um dado conhecimento matemático adquirido na escola pode auxiliar na resolução de situações do dia a dia. O professor assume papel fundamental no entendimento desta relação ao propor atividades que aproximem esses dois mundos: escola e outros contextos sociais em que os estudantes estão inseridos quando não estão na escola.

Como informações neste campo de estudo podem chegar até os gestores de escolas e até os professores que ensinam matemática?
A formação de professores é fundamental. Tanto a acadêmica, como  a sua formação continuada, em serviço, que permite que ele se atualize. Já os gestores precisam criar estratégias para atualização dos docentes.