ANáLISE SETORIAL » Educação técnica no Brasil: estamos próximos ou distantes do ideal?

por Julio Borba
Mestre em Neurociências e sócio da Valor Educacional

Publicação: 19/10/2019 03:00

Analisando a trajetória do ensino profissional brasileiro, percebemos que ela surgiu voltada para as classes menos favorecidas da população, que supriram necessidades de mão-de-obra para o mercado. Talvez isso explique o atual cenário da educação técnica como a opção de entrada no mercado, aliado a garantia de um salário um pouco melhor.

Mas, vamos ver por outro prisma: segundo o Anuário da Educação Básica, publicado pelo “Todos pela Educação”, o número de matrículas no ensino médio em 2018 foi de 10.396.970, estando a modalidade técnica com 1.868.917 estudantes. O Nordeste acumula 18,3% ou 524.656 matrículas, e Pernambuco ficou com 103.806 matrículas. Números que nos deixam atrás de países desenvolvidos e longe da meta do Plano nacional de Educação, que é de triplicar as matrículas da Educação Técnica com qualidade.

O Brasil está distante do referencial mundial de educação técnica, que hoje representa apenas 8% das matrículas do ensino médio. Se tomarmos a Alemanha como exemplo, 54% da força de trabalho é oriunda do ensino técnico, tendo 2,5 milhões ou 45% das matrículas do ensino médio. Na Alemanha, as empresas participam e opinam na formatação e constante atualização dos currículos dos cursos.

O Brasil ainda carece de qualidade na educação técnica e de programas feitos sob medida para as necessidades do mercado. As escolas apresentam o tema empregabilidade, porém esquecem de se unir e escutar as empresas, para montar cursos que sirvam para a demanda das necessidades.

Na Alemanha se aplica o sistema dual de aprendizagem. Neste modelo, os alunos passam apenas entre um e dois dias na escola recebendo teoria e, no restante da semana, atuam na prática em uma empresa, como estagiário remunerado.

No Brasil, um recente estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta um descompasso, pois somente 25% dos estudantes egressos de cursos técnicos, trabalham em ocupações que requerem esse tipo de formação. Isso mostra desajuste com as necessidades reais do mercado.

Muito precisa ser feito pela educação no Brasil. O acesso deve ser ampliado, os modelos educacionais precisam de revisão, professores precisam de capacitações. O estado precisa interferir menos. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) está aos poucos trazendo mudanças. Algumas escolas ainda acreditam que a tecnologia está como forma de mídia para atrair novos estudantes, enquanto deveriam investir na verdadeira tecnologia que está no método que melhor se adeque e professores capacitados e atualizados na teoria e prática.

A sociedade se transforma a cada dia, as profissões avançam e se remodelam. Porém, currículos se mantém engessados. O ensino técnico ganha mais atenção a partir da nova BNCC, com a escolha do caminho para a formação entre as ciências humanas, da natureza, matemática, linguagens ou formação técnica e profissional. O MEC já passa a dar indícios que pretende privilegiar a formação profissional, inclusive analisando o modelo Alemão. Quem sabe, teremos algo que renove o atual modelo e equilibre o contexto educacional do mercado de trabalho.