Ajuda humanitária no centro da polêmica Juan Guaidó adverte militares que impedir a entrada dos mantimentos dos EUA os torna "quase genocidas", enquanto Nicolas Maduro fala em "show político"

Publicação: 11/02/2019 03:00

O opositor Juan Guaidó, reconhecido por diversos países como presidente interino da Venezuela, advertiu ontem os militares que impedir a entrada da ajuda humanitária os torna “quase genocidas”. “Isso tem responsáveis e que o regime saiba disso. É um crime contra a humanidade, senhores das Forças Armadas”, disse à imprensa. Guaidó, chefe do Parlamento de maioria opositora, garantiu que os militares se tornam “vitimizadores por ação quando matam jovens que protestam, e por omissão quando não permitem ajuda humanitária”. Ele reiterou sua convocação para uma passeata amanhã, Dia da Juventude, em memória dos mortos - cerca de 40 em tumultos desde 21 de janeiro, segundo a ONU -, e para exigir que a ajuda seja permitida.

Medicamentos e alimentos enviados pelos Estados Unidos permanecem há três dias em armazéns do centro de coleta instalado em Cúcuta, Colômbia, perto da ponte fronteiriça de Tienditas, bloqueada por militares venezuelanos com dois contêineres e uma cisterna. O presidente venezuelano Nicolás Maduro afirma que a emergência humanitária é “fabricada por Washington”  para intervir no país petrolífero, descreve como “show político” o envio de ajuda e culpa as sanções dos Estados Unidos pela escassez de alimentos e medicamentos.

“Eu entendo que o regime se negue a reconhecer a crise que eles geraram, mas nós, venezuelanos, estamos trabalhando duro para cessar a usurpação (de Maduro no poder) e abordar esta emergência”, disse Guaidó, diante de um grande grupo de jornalistas e apoiadores. Na pior crise de sua história moderna, a Venezuela sofre com a escassez de produtos básicos e hiperinflação. Fugindo do desastre, cerca de 2,3 milhões de venezuelanos emigraram desde 2015, segundo a ONU.

DILEMA
A Força Armada, espinha dorsal do governo, iniciou ontem seus exercícios militares, que acontecerão até 15 de fevereiro em todo o país, para “fortalecer a capacidade defensiva do território”, segundo a convocatória. “Lamento pelo que fazem nossa Força Armada passar. Nós colocamos o dilema claramente, estamos dando uma ordem: permitir a entrada da ajuda humanitária”, disse Guaidó. Com esse “dilema” e a oferta de anistia, o oponente, de 35 anos, tenta romper o principal apoio de Maduro, embora a liderança tenha reiterado “lealdade absoluta”.

Guaidó anunciou que neste fim de semana centenas de voluntários se inscreveram para colaborar com o processo “complexo” de entrada de ajuda, e que em breve mais carregamentos chegarão aos centros de coleta no vizinho Brasil e em uma ilha caribenha. “Hoje, 300 mil venezuelanos são condenados à morte se a situação de emergência não for resolvida”, acrescentou o chefe legislativo.

Ontem, Guaidó também reiterou ser contrário a uma negociação com Maduro, afirmando que o governo usou as negociações anteriores para ganhar fôlego. “Hoje o tempo não está a seu favor. Como nunca antes, a democracia está perto, o futuro é nosso”, afirmou.

O Grupo de Contato Internacional (CGI), formado por países da Europa e da América Latina, se reuniu em Montevidéu na quinta-feira e pediu eleições presidenciais “livres” em sua declaração final. Maduro rejeitou o que considerou uma “parcialização” do CGI e disse esperar que o Papa Francisco aceite seu chamado para mediar uma negociação.

Os EUA apresentaram ao Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) projeto de resolução sobre a Venezuela, em que pedem que o país sul-americano facilite o acesso de ajuda humanitária internacional e realize novas eleições presidenciais. Em resposta, a Rússia propôs outra resolução, preocupada com “tentativas de intervenção em questões que estão essencialmente sob jurisdição doméstica” e “ameaças de uso da força contra a integridade territorial e a independência política” do país.