As gaivotas, os pombos e suas fezes

Vladimir Souza Carvalho
Magistrado

Publicação: 20/08/2016 03:00

As gaivotas reinam, soberanas e elegantes, nas águas do Rio Tejo e do Rio Mondego, em Lisboa e no Porto, respectivamente. As ondas indo e vindo, as gaivotas na água, subindo e descendo,  paradase disciplinadas, se deixando levar. Às vezes, no alto, se precipitam ante as águas do rio, para, com uma bicada, pegar um peixe miúdo que por ali passa, indo para lugar seguro a fim de melhor aproveitar o seu de comer.

O reinado das gaivotas se estende por muitos metros além do rio, imperando nos telhados. Do alto de um dos muros nas redondezas da Catedral da Sé, no Porto, vi a marca das gaivotas nos telhados próximos, num tom branco esverdeado, a assinalar a sua passagem por ali, sinal, na prática, a significar excrementos lançados, que, pela reiteração, acabam deixando sua marca bem visíveis. O telhado é das gaivotas, como o céu é do condor, poetaria Castro Alves, se tivesse ido a Lisboa e ao Porto.

Nessa parte, as gaivotas contam com a ativa participação dos pombos. Ah, dos pombos, que, na estação ferroviária do Porto, está escrito em algum lugar: Não alimente os pombos. Ou seja, os pombos que se virem, vão trabalhar, ganhar o pão com o suor de suas penas. Ora, ora. Se assim a autoridade do Porto delibera é porque vê no pombo algo de indesejável, sem condições de combate, pelo número destes no centro histórico, cantando galantemente as pombas, dando voos rasantes perante a multidão de turistas, mas sobretudo, como as gaivotas e com o consentimento tácito destas, defecando nas estátuas.

Da do Infante D. Henrique, sem o menor respeito, deram a sua vasta cabeleira um tom esverdeado,  numa cor que a indústria do tempo não trabalhava ainda. Mas, a grande e maior vítima foi Almeida Garret. Sua estátua, olhando para a Avenida dos Aliados, sentado, traz a marca da sua indignação ante todas as fezes que pombos e gaivotas, mais estes que aquelas, deixam cair. Foi a conclusão a que cheguei quando, me aproximando da estátua, vi Garret com o rosto voltado para o céu. Indignado, sim, com essas bonitas aves que, diariamente, durante a noite e o dia, sem respeito algum, cobrem seu rosto de merda. Só pode ser.