ELEIÇÕES 2018 » Multiplicação de símbolos da segurança Pelo menos 38 nomes, com ligação a segmentos da segurança pública, vão concorrer na eleição em Pernambuco defendendo ações contra a violência

Aline Moura
aline.moura1@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 20/08/2018 08:30

A bancada da segurança pública em Pernambuco pretende crescer, embalada na onda do conservadorismo e da intolerância da população com os altos índices de violência. Pelo menos 38 nomes vinculados à área no estado vão concorrer aos cargos de deputado estadual e federal nas eleições deste ano. Os candidatos vêm de vários segmentos, entre eles, bombeiros, militares reformados, membros das Forças Armadas, policiais civis e militares, guardas municipais e policiais rodoviários federais. Os planos de expansão estadual desse bloco assemelham-se aos do quadro nacional, que vai apresentar 1.166 candidatos no país inteiro, 41 a mais que em 2014. O discurso deles cobra maior respeito aos profissionais da segurança e redução da criminalidade, mas também usa como mote a diminuição da maioridade penal de 18 anos para 16 anos e a derrubada do Estatuto do Desarmamento.

A reportagem fez o levantamento dos números gerais no site do Tribunal Superior Eleitoral, mas é importante destacar que os dados ainda podem estar subestimados. E o motivo é simples. O TSE detalha as ocupações mais frequentes dos postulantes aos diversos cargos, mas, nesse caso, não dá detalhamentos, por exemplo, sobre o número de candidatos que trabalha na Polícia Federal, Rodoviária Federal, ou nas guardas municipais.

Ao especificar as profissões mais frequentes, contudo, os PMs da ativa despontam entre os que lideram a busca por um mandato. No Brasil, 590 candidatos são PMs, sendo 13 deles no estado. Os militares reformados estão em segundo lugar entre os que buscam um reconhecimento político, com a apresentação de 217 nomes nas unidades da Federação, 11 deles em Pernambuco.

Nacionalmente, esse bloco é conhecido como a “bancada da bala” porque teve apoio da indústria das armas e associações de atiradores civis nos últimos quatro anos, ou fez lobby a favor deles, a exemplo do próprio Jair Bolsonaro (PSL) e do cabo Daciolo (Patriota), ambos presidenciáveis. Como o financiamento privado foi proibido, não é possível dizer que eles serão novamente favorecidos por esse segmento, mas a oratória bélica atraiu um exército de fãs no Brasil, a maioria avessa ao que chamam de “mimimi” dos direitos humanos para “bandidos”.

Em Pernambuco, quem mais se beneficiou com o fortalecimento nacional da “bancada da bala” foram lideranças políticas vinculadas aos movimentos de segurança – que se destacaram, por exemplo, nas greves da PM e da Polícia Civil e da Guarda Municipal, essa última durou mais de 30 dias. O número de candidaturas entre os líderes mais que dobrou neste ano. Para se ter uma ideia, em 2014, apenas duas lideranças da área se aventuraram na disputa eleitoral: Alberisson Carlos da Silva (PTB) e Joel da Harpa (hoje no PP), esse último eleito deputado estadual e líder da greve de 2014. Agora, a situação se ampliou. As categorias sentiram o poder da voz da tribuna e se organizaram ainda mais.

Alberisson (PTB) e Nadelson Leite Costa (PSL) estiveram à frente da presidência e vice-presidência da Associação dos Cabos e Soldados e são, respectivamente, candidatos a federal e estadual. O presidente licenciado do Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais no Estado de Pernambuco, Frederico França, também é postulante à Câmara dos Deputados, bem como a presidente do Movimento Independente da Guarda Municipal do Recife, Marília Viana. O presidente licenciado do Sindicato dos Policiais Civis, Áureo Cisneiros, também é candidato a estadual. Entre os postulantes ao cargo, inclusive, ele é um dos poucos que vai contra o discurso de redução da maioridade penal. Dos quase 40 postulantes aos cargos de deputados, só quatro são ligados a partidos mais alinhados à esquerda, como PDT, PT e PSol.

Segundo o cientista político Pedro Soares, formado em relações internacionais, mestre e doutor em ciência política pela Universidade Federal de Pernambuco, o discurso de militarização da política brasileira acompanha o avanço da extrema direita mundial. “Quando o Brasil acompanha esse avanço, mostra que houve uma falência dos valores republicanos e democráticos. A gente não soube valorizá-los e mostrar que todo mundo tinha as mesmas oportunidades, direitos e garantias fundamentais”.

Para Soares, muitas lideranças estão se aproveitando desse vácuo deixado pela não garantia dos elementos republicanos. “As propostas de reformar o Estatuto do Desarmamento e reduzir a maioridade penal mostra que as pessoas não sabem o que é República e democracia. Muitas acham que República e democracia são apenas sinônimo de voto. Quando uma população pensa apenas isso é muito perigoso, não tem ideia do que está na Constituição, do que dizem as leis, nem ideia de para onde vai a nossa República. Uma reforma no sentido de militarizar a sociedade é assustadora e dá medo”.

Frente a frente // Joel da Harpa (PP) x Aureo Cisneiros (PSol)

Joel da Harpa (PP)

O que o senhor pensa sobre o Estatuto do Desarmamento e a redução da maioridade penal para 16 anos?


Dizem que aos jovens de 16 anos não podem ser responsabilizados por crimes mas podem votar aos 16 anos. Eles merecem toda a atenção do Estado, mas as pessoas não podem ficar à mercê de marginais de 16 anos. A redução da maioridade penal, de 18 anos para 16 anos, é apoiada por 87% dos entrevistados em uma pesquisa feita pelo Datafolha e divulgada em 2015. Quem tiver pena de menino de 16 anos, leve para dentro de casa. Agora leve com uma pistola na mão e com a cabeça cheia de crack. Eu quero ver esses elementos presos e eles pagarem com o rigor da Lei e serem processados pelo Código Penal. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tem pontos que chegam a ser aberrações para a sociedade brasileira. Esse pessoal não é vítima. Ele não merece defesa. Merece ir para a cadeia, pagar a pena e ser incluso no Código Penal Brasileiro. Sobre o Estatuto, o povo brasileiro foi às urnas participar de um referendo que restringia o uso de armas de fogo. Mas o estatuto mostrou ser um fracasso, quando restringe o cidadão de garantir sua própria defesa e, ao mesmo tempo, não desarmou aqueles que utilizam uma arma para vários tipos de crimes. A arma está entrando na fronteira e o cidadão não pode portar uma arma de fogo. Lógico que não defendo distribuir arma para todo mundo, mas o cidadão, passando por uma boa avaliação, fazendo cursos, porque não pode portar arma de fogo, se a Constituição lhe dá direito à legítima defesa?

Áureo Cisneiros (PSol)

O que o senhor pensa sobre o Estatuto do Desarmamento e a redução da maioridade penal para 16 anos?


O problema da violência no Brasil e em Pernambuco não é por causa da idade penal. O Estado brasileiro já é um dos que mais encarcera no mundo e, até agora, a violência só tem aumentado. Não será encarcerando mais jovens que teremos uma sociedade pacificada, e sim dando perspectiva de futuro à juventude. Sou policial e sei que quando tiramos um jovem infrator das ruas, no mesmo instante, o crime já tem mais dois para por em seu lugar. Temos que atacar a fábrica de criminosos, a raiz do problema, que é a miséria e a desigualdade social. Óbvio que isso não quer dizer um enfraquecimento das polícias, até porque somos igualmente vítimas desse sistema falido e perverso. Em relação à mudança para liberar mais armas, sou contra, pois, se nós, policiais treinados, muitas vezes somos surpreendidos e nos tornamos vítimas por estarmos armados, imagine o cidadão comum? Imagine, numa sociedade já tão estressada e oprimida como a nossa, o que seria de uma briga de trânsito com pessoas armadas? Ou uma discussão num bar? Entendemos que não se combate violência com mais violência, nem transmitindo para a população a obrigação que é do Estado em garantir segurança. Temos que parar com essa cultura da violência e do ódio. O Brasil sempre foi extremamente violento. Pernambuco igualmente. Isso só nos levou a ter números de guerra em nosso estado. Por isso adiantamos que não faremos parte de qualquer bancada da bala.

Bancada da bala e o Raio-X
  • 513 deputados compõem a Câmara Federal
  • 35 formam a chamada bancada da bala
  • 6,8% do total
  • 3,7% são policiais ou militares de carreira
  • 6 quantidade de deputados que têm o PR e PSL, partidos com maiores números de integrantes na bancada da bala
  • 1 apenas da bancada é pernambucano: Gonzaga Patriota (PSB)
  • 112 propostas para modificar o Estatuto do Desarmamento o grupo apresentou em 3 anos
  • 341 é o total de projetos que defendem os interesses da chamada bancada da bala
  • 331 pessoas físicas têm armas registradas no Brasil
Fonte: Estadão