ELEIÇÕES 2018 » Quando a indecisão vai para as urnas Para analistas políticos, são altas as chances de que a última fase do pleito tenha Jair Bolsonaro de um lado e, de outro, Ciro Gomes ou Fernando Haddad

Publicação: 14/09/2018 08:30

Se as eleições fossem nos próximos dias, seriam grandes as chances de saírem das urnas rumo ao segundo turno, de acordo com as pesquisas eleitorais mais recentes, Jair Bolsonaro (PSL) de um lado e, de outro, Ciro Gomes (PDT) ou Fernando Haddad (PT). O problema, alertam cientistas políticos, é que o pleito não é agora, mas daqui a três semanas. E faz tempo que as urnas são uma incógnita tão grande.

“As pesquisas apontam para a polarização no segundo turno, mas ainda há muita incerteza e possibilidade de oscilações neste quadro de crise política e econômica”, afirmou Paulo Calmon, diretor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (Ipol/UnB). Ele explica que a clivagem política não é um fenômeno brasileiro apenas: tem marcado as eleições mais recentes em todo o mundo. “Essa polarização não envolve apenas os conceitos tradicionais de esquerda e direita, mas também a ideia de renovação política”, explicou.

As chances de um dos candidatos mais radicais no espectro ideológico vencer a eleição é algo visto com ressalvas em vários setores da academia e do mercado, por apontar para instabilidade política e obstáculos ao crescimento econômico. É tudo o que o país não precisa neste momento. Roberto Romano, professor de filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) acha que Bolsonaro, Ciro ou Haddad teriam dificuldades para governar. “O Centrão vai se apresentar com a tradicional fome por cargos e recursos qualquer que seja o eleito”, ressaltou.

Bolsonaro, apesar da experiência como parlamentar, não se tornou um político. “Ele faz questão de ressaltar isso na campanha. Tivemos a experiência de ver o desempenho de alguém que se limita a ter uma visão militar das coisas: Dilma Rousseff”, comparou. Haddad, embora seja bem diferente de Dilma, na avaliação de Romano, enfrentou também grandes problemas no relacionamento com o Legislativo quando foi prefeito de São Paulo.

Ciro também enfrenta problemas por ser visto como impaciente e irascível. Mas teria a vantagem, destacou o professor da Unicamp, de poder contar com alguma boa vontade da bancada petista, diferentemente de Bolsonaro.

Geraldo Alckmin (PSDB), o candidato mais moderado politicamente e preferido por analistas de mercado, e Marina Silva (Rede) aparecem empatados tecnicamente, dentro da margem de erro, com Ciro e Haddad. A desconfiança de que consigam ir para o segundo turno ocorre por diferentes razões. Do ponto de vista das pesquisas, Alckmin ficou estável, enquanto os outros subiram. Marina chegou a perder pontos na preferência do eleitor.

Para Calmon, Alckmin tem a vantagem da experiência administrativa, que vem com o ônus de ser considerado um político tradicional. “Ele pode crescer se conseguir demonstrar que pode, sim, promover grandes mudanças”. Marina, embora tenha a seu favor a moderação, ficou com o que há de mais negativo ao se posicionar no meio do espectro ideológico. “As pessoas conservadoras a veem como petista. E quem está na esquerda acha que ela é de direita”, apontou.

Na espera
A possibilidade de os representantes de centro deslancharem não é totalmente aceita pelo cientista político Sérgio Praça, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), pelo tom hegemônico dos discursos nesta eleição. “A ascensão de Bolsonaro puxa para esse lado mais radical. Isso coloca Ciro e Haddad como os principais candidatos para confrontá-lo como representantes da esquerda”, avaliou. Para ele, no entanto, ambos adversários do candidato do PSL têm chances de ir ao segundo turno. “Essa é uma disputa que será definida nas próximas semanas. Ciro faz uma campanha bem-sucedida e Haddad, apoiado por Lula, pode crescer”, disse. O ataque ao candidato do PSL, Jair Bolsonaro, e as derrotas de Lula na Justiça em anular a inelegibilidade decretada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também são fatores que intensificam a polarização, favorecendo o discurso emocional.

A narrativa construída pelos apoiadores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de um preso político e injustiçado, somada à tese de golpe contra Dilma e às reformas promovidas pelo governo de Michel Temer, também favorecem a polarização, avalia o sociólogo e cientista político Fábio Metzger, professor da Uniesp. “Temos Haddad e Ciro como herdeiros do espólio de Lula. O fato de ele estar preso gera um polo na esquerda, criando uma espécie de fidelização ao lulismo”, ponderou. O cenário inibe o discurso racional e centrista em ambos espectros políticos, prejudicando Marina e Alckmin. “Há espaço para as ideias racionais, mas elas estão sendo obliteradas pelo passionalismo”, sustentou. (Correio Braziliense)