ENTREVISTA » "Somos do bloco contra a corrupção" José Múcio Monteiro // novo presidente do TCU

Rosália Rangel
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Publicação: 11/12/2018 03:00

Após nove anos de atuação no Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro José Múcio Monteiro assume hoje a presidência da instituição. A solenidade será às 10h, no edifício-sede do TCU, em Brasília, e contará com a presença do presidente Michel Temer (MDB). Conhecido pela capacidade de articulação e com bom trânsito no meio político, o novo presidente do TCU iniciará o mandato com a responsabilidade de comandar a fiscalização das contas do primeiro ano de governo do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL). Em entrevista ao Diario, José Múcio falou sobre o momento de transição política pela qual passa o país e foi enfático em falar do papel do TCU. “Aqui não há partido político nem viés político e muito menos eleitoral. A gente torce para quem estiver no poder aplicar bem o dinheiro público”, alertou o ministro, que chegou ao TCU em 2009 indicado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de quem foi ministro de Relações Institucionais durante o segundo mandato do petista. O ministro disse, ainda, acreditar no poder de fiscalização de 200 milhões de brasileiros que, na avaliação dele, fizeram da campanha de 2018 a “eleição mais direta do país”.

José Múcio irá substituir o atual presidente  do TCU, Raimundo Carreiro. No exercício do mandato, que é de um ano com possibilidade de reeleição pelo mesmo período, ele terá como vice-presidente a ministra Ana Arraes, também pernambucana. Antes de chegar ao tribunal, José Múcio construiu uma trajetória na política, disputando, em 1986, o governo de Pernambuco pela Frente Democrática. Ele perdeu a eleição para Miguel Arraes, pai de Ana Arraes. Quatro anos depois conseguiu se eleger deputado federal pelo PFL, exercendo cinco mandatos na Câmara dos Deputados por diferentes partidos. Abaixo a entrevista do ministro.

Quais os seus projetos na presidência do TCU?
O TCU é um órgão de estado. Não é um órgão de governo. Não é uma mudança de governo que muda a conduta do TCU. Somos controladores do dinheiro público aplicado pela União. Onde houver um dinheiro público aplicado, a presença do TCU é requerida para que se faça a fiscalização da boa aplicação. O que nós podemos fazer é mexer nas prioridades, dependendo do que o governo pretende fazer. O governo quer dar prioridade a concessões? O governo quer dar prioridade às privatizações? O governo quer dar prioridade às obras paradas? Então, nós também temos um elenco de prioridades que podemos mexer com elas para ajudar. O fundamental, neste momento, nesta fase difícil que o país está atravessando, com o país com 14 milhões de desempregados, é que  caminhemos por caminho da geração de emprego e sejam retomadas as obras que estão paralisadas nos diversos pontos do país. Isso é uma coisa que o Tribunal quer ser parceiro. Só não somos parceiros no mal feito. No bem feito a gente pode ser grande auxiliar.

O orçamento previsto para o TCU em 2019 é suficiente para a instituição cumprir todas as obrigações constitucionais?
Não. É da conta para menos. Vamos ter que fazer uma gestão bem segura, mas é dentro do quadro do Brasil.

Como o senhor analisa o aumento do teto do funcionalismo público que foi aprovado recentemente?
Sobre isso só quem pode falar é o Legislativo e o governo. Não cabe a nós julgar.

Como o senhor avalia a atual situação do país, que passa por um processo de transição para um novo governo?
Tenho duas análises. Como presidente do Tribunal de Contas, a conduta do tribunal é a mesma. Somos fiscais, seremos fiscais e vamos continuar fiscalizando. Aqui não há partido político nem viés político e muito menos eleitoral. A gente torce para quem estiver no poder aplicar bem o dinheiro público. Somos do bloco que combate a corrupção, combate o superfaturamento, combate as licitações fraudadas. É esse o nosso papel. Agora podemos ser um grande parceiro para o bem-intencionado.

Jair Bolsonaro foi eleito focando a campanha dele no combate à corrupção e tem demonstrado que esse será o lema do seu governo. Que avaliação o senhor faz sobre essa questão?
Essa foi a mais direta das eleições da história do Brasil. Uma eleição onde todo mundo tinha um celular e fez a campanha para quem não tinha nem um minuto de televisão. Temos hoje 200 milhões de auditores que manifestaram suas vontades e suas indignações através do voto. Enfrentaram partidos e mudanças radicais no quadro político. Mas agora passou a eleição, terminou a apuração e é hora de dar as mãos. Quem gostou e quem não gostou. É a mesma coisa de você estar em um avião e torcer, porque não gosta do piloto, para ele fazer uma bobagem. Você tem que conduzir bem o avião para quem está dentro dele. O comandante do país vai comandar o meu país. O país que eu vivo. Então, eu quero que ele conduza bem.

Apesar da postura contrária à corrupção, um dos futuros ministros de Bolsonaro (Onyx Lorenzoni) está sendo investigado por uso de caixa dois. Qual sua opinião sobre isso?
Uma coisa é a denúncia. Outra é a apuração. Precisamos ter cuidado para não se contaminar conceitos nessa emoção. Temos que ir com calma. Mas acho que, no momento em que ele (Bolsonaro) colocou doutor Sérgio Moro (no Ministério da Justiça e Segurança Pública), montou uma equipe sem negociar (com partidos), já mostrou que estava querendo fazer uma coisa realmente diferente.

Qual sua opinião sobre o projeto de lei que livra os prefeitos de qualquer punição quando a arrecadação cair mais de 10%?
Não somos legisladores. Aqui (no TCU), somos pagos para cumprir as exigências da lei. Não podemos dizer se a lei é boa ou ruim. Nosso trabalho é fiscalizar que se cumpra a lei. Desde que a lei seja pela responsabilidade fiscal. Então, você pode me perguntar o que achei de mexerem na Lei de Responsabilidade Fiscal? A minha resposta está na pergunta. Mexeram na lei. Os funcionários do Tribunal de Contas, dos órgãos que representam o Tribunal de Contas, fizeram cartas de protesto. Fizeram cartas para o presidente da República, pedindo para que essa lei não seja sancionada. Agora, isso é uma posição do cidadão. Como presidente do Tribunal não posso dizer se a lei é boa ou ruim. Tenho que fazer cumprir a lei. Eu não mexeria. Mas não conheço as razões. Não conheço o processo. O Congresso tem sua responsabilidade. Se fizeram isso, fizeram por algum motivo.