Bolsonaro frustra, mas Guedes anima Estreia do presidente em Davos foi marcada por discurso curto e superficial, compensado pela mensagem de ministro Paulo Guedes aos mercados

Publicação: 23/01/2019 03:00

O presidente Jair Bolsonaro fez ontem sua estreia internacional no Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça), com um discurso curto, de apenas seis minutos, em que falou de abertura comercial, mas não detalhou as reformas que pretende fazer. A estratégia inicial era que Bolsonaro reforçasse as mudanças na Previdência, mas o presidente foi instruído a fazer uma fala enxuta, sem focar na reforma, por ser um tema de mais interesse dos brasileiros do que da comunidade internacional.

Antes de falar no palco principal do evento que reúne a elite financeira global, Bolsonaro almoçou sozinho no bandejão de um supermercado local, longe dos encontros formais entre chefes de Estado, executivos e investidores. Quem assumiu o papel de transmitir uma mensagem forte ao mercado, principalmente sobre Previdência, foi o ministro da Economia, Paulo Guedes. Em almoço com investidores, ele falou por 90 minutos sobre seus planos para a economia. Afirmou que haverá consenso no Congresso para aprovar as mudanças e que terá apoio dos governadores para avançar.

Mais tarde, em reunião fechada com executivos de multinacionais, como Embraer, Nestlé e Arcelor Mittal, o presidente e seus ministros disseram que o projeto de reforma será apresentado já nos primeiros dias da próxima legislatura, que é prioridade, mas que pode não sair exatamente como previsto por causa das negociações com os parlamentares. Sobre o discurso de Bolsonaro, um banqueiro alemão reclamou da falta de informações. “Ele deu manchetes, mas nós queremos detalhes”, disse.

O presidente do conselho do Itaú Unibanco para a América Latina, Ricardo Marino, avaliou que a fala serviu para “educar” quem não conhece o Brasil. “Foi genérico, mas para quem não está educado sobre o Brasil, ele vê que novo ciclo chegou.”

Se Bolsonaro ignorou a Previdência no discurso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tratou de transmitir uma mensagem forte a investidores no encontro promovido pelo Itaú Unibanco. Guedes afirmou que “vai tirar consenso” para aprovar a proposta de emenda constitucional que vai endurecer as regras para se aposentar no país para equilibrar as contas públicas. Investidores que estiveram no almoço organizado comentaram que a palestra de Guedes “foi um show”.

A ausência de um compromisso forte de Bolsonaro com a reforma, em seu discurso, também frustrou integrantes da área econômica do governo e empresários brasileiros. Segundo um presidente de uma empresa brasileira, o discurso de Guedes no almoço com investidores “equilibrou” a falta de ênfase de Bolsonaro.

A expectativa agora se volta para a entrevista que o ministro da Economia dará hoje no centro de mídia do Fórum. No encontro do Itaú, para rebater a preocupação dos investidores com o risco de o Congresso travar a aprovação da reforma, Guedes colocou suas fichas numa frente ampla de governadores.

“Ele foi bastante firme nas reformas e disse que vai tirar consenso”, contou o presidente da Embraer, Paulo Cesar de Souza e Silva. Segundo os organizadores, o encontro despertou muita atenção neste ano pela procura de executivos de bancos e outras empresas interessados em ouvir Guedes. Comparado a edições antigas, o evento foi mais concorrido e contou com cerca de 100 pessoas.

Capitalização

O executivo da Embraer disse que o ministro voltou a repetir que a proposta vai ter a introdução do regime de capitalização (sistema pelo qual as contribuições são feitas para uma conta individual, que banca os benefícios no futuro), mas de forma “segura”.

“Só falou que tem tomar cuidado para ser balanceado”, disse Silva. Segundo o presidente do conselho de administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, investidores quiseram saber se o governo Bolsonaro teria apoio do Congresso para aprovar a reforma. O risco da reforma travar no Congresso foi apontado ontem como a principal preocupação sobre o Brasil entre os presentes no evento, que reúne a elite financeira internacional. Trabuco disse que Guedes respondeu que o governo não vai ter dificuldade para aprovar o texto e ressaltou a força dos governadores para conseguir aprovação da reforma no Congresso. Segundo Trabuco, Guedes reforçou no encontro a presença do governador de São Paulo, João Doria, que coordena o fórum dos governadores, de onde saiu uma frente de mobilização dos Estados pró-reforma.

De acordo com o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, Paulo Guedes deixou os detalhes sobre as mudanças para ser anunciados apenas quando estiver de volta ao Brasil. (Agência Estado)