Sem se desligar do Brasil Bolsonaro seguiu para a Suíça, onde estreia no cenário internacional, levando na bagagem um conflito interno no PSL e o filho que teve as contas vasculhadas

Publicação: 21/01/2019 09:00

O presidente Jair Bolsonaro embarcou ontem para Davos, na Suíça, onde participará do Fórum Econômico Mundial. Rumo à primeira viagem internacional para encontrar a elite financeira global, Bolsonaro deixa o país no meio de uma crise política que pode contaminar a imagem no início de gestão. Parlamentares eleitos do partido dele, o PSL, protagonizam um racha interno na sigla porque alguns colegas viajaram a convite para a China e colocam em xeque a governabilidade de Bolsonaro junto ao Congresso. Além disso, um de seus filhos, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), tem as contas vasculhadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Diante dessas polêmicas, o governo traça estratégias para conter a ferida — ao menos até a volta do presidente, prevista para sexta-feira, sem horário definido.

A fim de evitar que a turbulência ao redor de Bolsonaro não interfira no curso da administração do governo, o primeiro escalão do Planalto começou a colocar medidas em prática para tentar blindar a nova gestão do país. A equipe ministerial foi orientada a não falar sobre o caso em público, com o objetivo de reforçar o viés que aliados do presidente querem dar à situação: uma questão particular de Flávio, e não de Bolsonaro. Pessoas próximas ao presidente falaram que, neste momento, a tendência é ressaltar, sempre que possível, a independência entre os assuntos e as esferas públicas, deixando Bolsonaro de fora do cenário conturbado. No sábado pela manhã, o senador eleito esteve no Palácio da Alvorada para conversar com o pai. O conteúdo da reunião não foi divulgado pelo governo.

No entanto, a melhor maneira para conduzir o governo em momentos de crise ainda não é um consenso nem mesmo dentro do Planalto. Isso porque há também outra parte da equipe do presidente que, com medo de os escândalos afetarem a aprovação popular ainda no início da gestão, acreditam que Flávio deveria conceder mais entrevistas à imprensa e dar explicações sobre o episódio. Na sexta-feira, o senador eleito, que foi alvo novamente de um relatório do Coaf, falou à TV Record e negou todas as acusações, inclusive, de usufruir do foro privilegiado —, benefício criticado por ele, pelos irmãos e pelo pai durante toda campanha eleitoral, como uma ferramenta da “velha política” para conseguir reverter situações na Justiça.

Para a advogada e constitucionalista Vera Chemim, o recurso do filho do presidente no Supremo Tribunal Federal (STF), que alegou foro privilegiado, “pareceu ingênuo”. “Ele foi apenas citado, não investigado. A partir do momento que ele faz isso, ele passa a chamar para si a responsabilidade”, explicou. Já o cientista político e vice-presidente da Arko Advice, Cristiano Noronha, entende que o Planalto terá de dar explicações, mas não acredita que o fato possa se transformar em uma crise na nova administração. “O presidente não é investigado, é uma pessoa bem próxima da família, mas não é o Jair diretamente. Eu ainda não vejo que há essa capacidade de contágio, mas é preciso responder perante a sociedade”, explicou.

DESVINCULAR
A decisão de integrantes do governo de tentar desvincular Bolsonaro das suspeitas de lavagem de dinheiro que rodeiam o filho foi confirmada também por um militar próximo à cúpula do Planalto. No entanto, ele teme que o caso esteja apenas “começando”, já que, segundo a fonte, “tem tudo para aumentar”. “Evidentemente, o governo tem obrigação de tentar se desvincular, mas será muito difícil. É batom na cueca”, declarou.

De acordo com o militar, o discurso anticorrupção, utilizado pela família Bolsonaro, durante a campanha eleitoral, tende a dar uma proporção maior ao fato. Assim, o “despreparo” do filho pode chegar às portas do Planalto. “É inconcebível você pedir para os funcionários depositarem na sua conta. Não tem saída, ele vai dizer o quê? Ele deixou o rastro”, criticou. Até então cotado para ser um dos interlocutores do Executivo no Senado, Flávio deve começar o mandato, em fevereiro, com as pretensões comprometidas. “Tudo que a oposição quer é isso. É um presente a eles”, disse.

O futuro líder do PSL na Câmara, o deputado Delegado Waldir (GO), minimizou a polêmica e avaliou que “não há crise alguma”, sobretudo, porque o foco das duas questões não é o presidente diretamente, mas quem está ao seu redor. “Não é um assunto de governo, é um assunto do PSL. Não é um assunto do Bolsonaro, mas do filho dele. Talvez, porque esses assuntos ainda sejam recentes, têm ganhado maior repercussão. Por isso, acredito que tentam enfraquecer o governo, mas não é possível. Tudo o que está acontecendo vai nos fortalecer e vamos tomar vacina contra isso”, complementou. O delegado afirmou que o diálogo entre os parlamentares da sigla se intensificam para manter uma ordem e dar apoio às pautas do governo — mesmo que alguns correligionários novatos demonstrem resistência neste início de mandato. (Do Correio Braziliense)