"Sinto Pernambuco sem muita voz" Entrevista - Armando Monteiro (PTB) // ex-senador

Rosália Rangel
rosalia.rangel@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 23/02/2019 03:00

Mesmo sem exercer mandato partidário, o ex-senador Armando Monteiro Neto (PTB) tem em mente sua linha de atuação no estado. O petebista, que disputou o governo de Pernambuco na eleição passada, descarta a possibilidade de concorrer à Prefeitura do Recife, em 2020, mas se diz disposto a ajudar qualquer nome dos “companheiros” da oposição que começam a surgir no cenário político como prováveis candidatos. “O eleitor está precisando de novos rostos, novas figuras”, justificou. Armando também coloca entre os planos futuros manter o vínculo com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), levando a instituição a participar de debates que possam a ajudar no desenvolvimento do Nordeste. Na última segunda-feira, o ex-senador visitou o Diario de Pernambuco, sendo recebido pelo vice-presidente, Maurício Rands. Na ocasião, apresentou um balanço do mandato exercido no Senado  (2011/2019). No cargo, Armando conseguiu liberar R$ 341 milhões (valores atualizados) em emendas, que foram repassados para 130 municípios pernambucanos. O ex-parlamentar também fez questão de destacar o trabalho realizado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), da qual foi  membro titular. Na CAE, ele ressaltou a iniciativa de integrar a comissão em temas microeconômicos com o objetivo de melhorar o ambiente de operação das empresas no país. O petebista  falou, ainda, de projetos que ajudaram no desenvolvimento do estado, citando entre eles o que ampliou o prazo de incentivos fiscais para Jeep, instalada em Goiana. Abaixo veja os tópicos da entrevista do ex-senador.

Balanço do mandato
Procurei focar muito na área econômica e o saldo não é só do ponto de vista do número de relatorias, de projetos de nossa autoria, de iniciativas de projeto de decreto legislativo, audiências que foram realizadas, mas nesse balanço, que é quantitativo, há algumas coisas que considero  interessantes. Conseguimos, por exemplo, converter em lei um projeto (PLS 279) de desburocratização, que é um avanço e foi aprovado ainda no governo Temer. É um projeto que dispensa essa coisa de autenticação, reconhecimento de firma. Simplifica a vida das pessoas. O Brasil tem essa herança, que é da nossa cultura, o negócio da desconfiança. O cidadão precisa atestar tudo. Então, essa agenda da desburocratização foi uma contribuição importante. Outro iniciativa resultou na Universidade do Agreste. Iam criar a Universidade do Vale do Parnaíba e, na última hora, conseguimos encaixar a criação da Universidade do Agreste Meridional. Uma conquista para Pernambuco.

Incentivo fiscal
É de nossa autoria também a emenda que resultou na prorrogação de incentivo fiscal da Fiat, de 2020 a 2025. Levando em conta as restrições fiscais, os incentivos não têm o calibre do regime anterior,  mas, ainda assim, foi possível prorrogar com 60% dos incentivos. Esse projeto também inclui a renovação de um regime geral que, vamos dizer assim, é a visão da indústria automotiva até 2030. O projeto encaixou a renovação do regime automotivo do Nordeste, que vai permitir um novo ciclo de investimento à planta de Goiana. A Fiat vai investir R$ 7,5 bilhões para aumentar a produção de 250 mil unidades/ano para 350 mil. Serão 100 mil unidades a mais na Jeep de Goiana. Além disso,  38 fornecedores de autopeças novos virão para o polo. Nesse horizonte de mais cinco anos, vamos produzir, de maneira integrada, o veículo no Nordeste, tendo custo mais competitivos em relação à indústria do Sul. Essa planta é um sucesso no mercado brasileiro e lá fora, com uma importação de 70 mil unidades por ano.

Aposentadoria
Outro ponto que destacaria nesse trabalho, entre as relatorias de maior impacto social, seria a que permite a dona de casa se aposentar pagando 5% do INSS. Atingiu o micro e pequeno empresário e, por extensão, a dona de casa que terminou sendo contemplada também. A emenda vale mesmo com a reforma da Previdência porque já está em vigor.

CAE
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado se limitava a fazer um debate das questões macroeconômicas, conjunturais, receber o presidente do Banco Central. Nós colocamos a CAE nos temas microeconômicos que afetam o ambiente de operação das empresas. O Brasil é um país complicado para as empresas operarem. Bolsonaro disse em Davos que queria colocar o Brasil numa posição melhor no Doing Business, que é o relatório do Banco Mundial. Temos um dos piores ambientes do mundo para operação das empresas. Seja pela burocracia, qualidade da regulação, sistema tributário, porque os spreads bancários, que são muito altos. Tudo é hostil. Fizemos um grupo de trabalho para elaborar um diagnóstico da produtividade no Brasil, estagnada há 10 anos. O relatório ficou pronto no ano passado, inventariando todos os projetos que estavam no Congresso e afetam positivamente esse ambiente. A exemplo do Cadastro Positivo (aprovado na última quarta-feira na Câmara, seguirá para nova votação no Senado), mal introduzido no Brasil, dando a opção de entrar no banco de dados quando no mundo inteiro se dá a opção de sair.

CONVOCAÇÃO
Aprovamos também um projeto, por decreto legislativo, que obriga o ministro-chefe da Casa Civil a prestar contas à CAE semestralmente para dizer como essa agenda de melhoria de negócio evoluiu no Executivo. Temos, então, um roteiro com esse relatório. Todo roteiro de como o Senado pode ainda atuar para que essa agenda se mova. É uma agenda que demanda muita articulação. São várias áreas. Precisa de uma coordenação intragovernamental e o Congresso tem que ficar olhando e cobrando essa agenda.

Expectativa no brasil
Costumo dizer que sobre o Brasil estou moderadamente pessimista, para não ficar como um pessimista impenitente, nem tampouco minto. No caso de Pernambuco, considero que estou sempre condenado a um exercício de esperança. Agora, não tenho ainda elementos para achar que tudo aquilo que eu achei que era um déficit do primeiro governo de articulação, presença nacional, resultados mais tangíveis em algumas áreas de políticas públicas muito sensíveis.

Governo do estado
É difícil para mim porque, na medida em que a gente vai para disputa e perde, fica parecendo uma posição. O que me parece agora é que a equipe e o governo estão mais próximos do governador. Ele teve maior liberdade para formar a equipe. É o que parece. É uma espécie de governo Paulo Câmara 2. Mas é sempre bom dar um crédito pelo menos na expectativa. Não torço pelo pior. Agora continuo sentindo um déficit da presença de Pernambuco no cenário nacional. Sinto Pernambuco sem muita voz, sem muita presença.

Gestão estadual
Na segurança, tivemos uma tal deterioração de maneira que os índices não podiam piorar mais. Chegamos ao fundo do poço. É evidente que teria uma curva melhor. Não era possível ser pior do que foi. Chegar a 5.500 homicídios como chegamos! Era de se esperar que seria revertido com alguma medida. O quadro da saúde pública em Pernambuco, por exemplo, é muito complicado. Por outro lado, temos na área de infraestrutura desafios imensos. Quais os projetos que iremos priorizar? A Ferrovia Transnordestina não sai do lugar. É precisa revogar essa concessão e tomar um rumo. Não é possível que a Transnordestina fique do jeito que está.

Bancada
Recebi uma visita do senador Jarbas (Vasconcelos). Uma visita delicada, cordial e para se colocar à disposição. Falei para ele que o melhor que poderia fazer para ajudar decisivamente, pelo seu peso político, seria articular as bancadas de Pernambuco e a regional. O governo Bolsonaro se elegeu sem explicitar uma agenda para o Nordeste. O desafio dessas bancadas é de cobrar do governo um projeto para região. O governo federal tem que explicitar alguma coisa. Quando Bolsonaro cita a tecnologia de Israel para transformar água do mar, isso é um desejo. É a expressão de um desejo, mas precisamos de um programa para a região, mostrando o que deve ser priorizado. Na área de infraestrutura hídrica, tem muitas obras que precisam ser concluídas, como a adutora do Agreste, a Transposição, o Ramal do Agreste. A Transnordestina é uma prioridade indiscutível. Essa é a hora de colocar na mesa a necessidade de uma definição dessa agenda porque (o governo Bolsonaro) vai precisar de capital político para aprovar a reforma da Previdência.

Governadores
O fórum (dos governadores do Nordeste) não tem conseguido, a meu ver, resultados mais efetivos. Sinto isso. Acho que fica muito preso a uma agenda conjuntural e perdeu a visão dos temas mais estruturantes da região. Mesmo quando tratam de infraestrutura, querem, sem compreender as limitações da atual conjuntura, fazer grandes projetos. Todo estado quer um porto, grande projeto e não foram capaz de pensar a logística regional de forma integrada, com a visão integrada. Acho que essa visão dos governadores ainda é muito partida e a região padece porque não foi capaz de explicitar uma agenda nova. Acho que, nesse sentido, como integrante da classe política regional também me penitencio por não ter dado uma contribuição maior ao que seria o novo conceito de uma política regional.

Equipe econômica
A agenda da equipe econômica em prol do mercado tem muita coisa interessante. Mobilizaram pessoas competentes. Agora, o problema do governo Bolsonaro é uma certa revelação precoce de desarticulação. E como vai se dar a articulação com o Congresso? Esse é o grande desafio. Eles dizem que será novo o padrão (de governo), reduzindo a taxa de fisiologismo, do custo do chamado presidencialismo de coalizão. Temos um bom projeto na área econômica, indiscutivelmente, que está sendo bem comandado por Paulo Guedes. Agora qual a garantia que temos de que isso vai ter trânsito e uma infantaria capaz de garantir esse projeto? Até reconheço que, hoje, Rodrigo Maia (presidente da Câmara) é um ator importantíssimo e tem revelado estatura para trabalhar pelas reformas. Mas a gente vê um governo ainda muito desarticulado.

Eleição municipal
Tenho que poupar o eleitor da minha presença. O eleitor está precisando de novos rostos, novas figuras. Vou ficar junto desses companheiros. Vou dar um palpite de quem está olhando o processo agora e, talvez, até uma manifestação prematura. Acho que teremos múltiplas candidaturas. É o meu palpite, porque tem muita gente da oposição se apresentando e mais na frente se faz uma estratégia para se reunir, eventualmente, no segundo turno. Teremos, possivelmente, uma candidatura de Daniel Coelho, de Silvio Costa Filho. No DEM, pode ser Mendonça Filho ou Priscila Krause. Outra possibilidade seria um nome do grupo Ferreira, com André Ferreira. O deputado estadual Marco Aurélio, que é ligado a Fernando (Bezerra Coelho), foi falado nos últimos dias também. Então, estou contemplado com esses companheiros que estiveram alinhados conosco e qualquer um deles posso ajudar.

Disputar A eleição
Não sei. Não está nos meus planos agora. Pode ser. Quem sabe? Mas agora não. Nesse horizonte de 2020, seguramente não. Quero ajudar nos bastidores. Já dei minha cota no processo eleitoral. Já fui duas vezes candidatos a governador.

Faltou no mandato
Sempre falta alguma coisa. Gostaria, por exemplo, de ter feito uma ação mais articulada no próprio Senado em relação à agenda econômica. Com a agenda da CAE, poderíamos ter feito uma articulação mais ampla no sentido que todos pudessem incorporar essas agendas. Também poderia ter dado uma contribuição maior ao desenvolvimento regional. O conceito de abordagem  mudou. Não adianta querer reeditar políticas que estavam dentro da outra lógica econômica. Poderia ter discutido mais um novo conceito da política de desenvolvimento regional. Sempre falei que poderíamos ter modelado as PPPs, por exemplo, poderiam ter sido ajustadas à realidade do Nordeste, tornando mais atrativo o investimento. O mundo mudou e está mais integrado. O Nordeste perdeu muito por não ter uma visão atualizada disso.

Futuro
Vou participar dos debates sobre Pernambuco com maior liberdade, participando de eventos. Também estarei vinculado à Confederação Nacional da Indústria (CNI), ao Conselho de Economia. Vou também introduzir a visão espacial regional do desenvolvimento e colocar a CNI mais nessa discussão.