"A situação está sob controle"

Publicação: 19/10/2019 03:00

Assim que foi convidado pelo presidente Jair Bolsonaro para assumir o Ministério da Defesa, Fernando Azevedo e Silva traçou como meta prioritária reestruturar as Forças Armadas e a carreira militar. General de Exército, o posto mais alto na estrutura militar, Azevedo conhece profundamente a situação das Forças Armadas. Nesta entrevista ao Diario de Pernambuco, ele fala sobre os desafios à frente da Defesa, como também comenta sobre as manchas de óleo que chegaram a mais de 185 praias nos nove estados nordestinos nas últimas semanas: É a maior tragédia ambiental da região.

Entrevista - Fernando Azevedo e Silva  // Ministro da Defesa

No nosso litoral, o que vem preocupando é a situação do óleo nas praias do Nordeste. Já é possível alguma conclusão?

O caso é bastante complexo e inédito no Brasil. As investigações ainda estão em curso. Muitas hipóteses são consideradas, incluindo naufrágios e derramamentos acidentais. No momento, o Centro Integrado de Segurança Marítima (CISMAR) analisa o tráfego de embarcações, em especial de Navios-Tanque que passaram por uma área de 36 mil milhas náuticas quadradas na Zona Econômica Exclusiva do Brasil no litoral nordestino. Já se identificou o trânsito de cerca de 150 navios entre 1º de agosto e 1º de setembro. A Marinha notificou os navios, que transportavam cargas com características compatíveis ao petróleo cru, para prestarem esclarecimentos. A Marinha e os órgãos ambientais agiram rapidamente acompanhando a crise e atuando desde o surgimento das primeiras manchas, no início de setembro. A situação está sob controle.

Há um monitoramento constante dos mares brasileiros para averiguar possíveis vazamentos de óleo como esse do Nordeste?
A Marinha do Brasil atua permanentemente no monitoramento do tráfego marítimo, cabendo à Força promover a implementação e a execução da Lei de Segurança do Tráfego Aquaviário e prevenindo a poluição ambiental por parte de embarcações, plataformas ou suas instalações de apoio. São empregados, aproximadamente, 5 mil homens e 650 embarcações nas capitanias dos portos, delegacias e agências subordinadas em todo país, garantindo a navegação em Águas Jurisdicionais Brasileiras e atendendo aos requisitos de segurança e prevenção à poluição hídrica.

Outra pauta ambiental que chamou atenção no mundo inteiro foi a questão das queimadas na Amazônia. Como está a situação?
Exatamente. A Operação Verde Brasil foi uma resposta rápida que o governo federal deu para combater as queimadas e outros ilícitos ambientais que estavam ocorrendo na Amazônia Legal. Em agosto, o presidente assinou um decreto determinando o emprego das Forças Armadas em uma operação de Garantia da Lei e da Ordem – a primeira GLO Ambiental. É um trabalho realizado com outras agências federais e estaduais, que vem dando certo. Criamos três centros de Coordenação Conjunta: o da Amazônia, o do Norte e o do Oeste. Com criterioso planejamento, as Forças Armadas dão suporte logístico e apoio de pessoal para que os demais órgãos cumpram suas missões. Os resultados obtidos são bastante positivos, com sensível redução dos focos de calor em setembro, ficando bem abaixo da média histórica. A GLO se encerra no próximo dia 24.

Que resultados foram alcançados?
Depois de dois meses atuando junto à Polícia Federal,  Ibama,  ICMBio e outros órgãos, foram efetuadas diversas prisões, apreensões e milhões de multas foram aplicadas. De agosto para setembro, caiu 15% o número de focos de queimadas, algo inédito. Esses meses são os mais secos na região, o que propicia aumento dos focos de calor. Historicamente, ao invés de queda de 15%, o que ocorria era o aumento de mais ou menos 50% dos focos. Portanto, percebe-se claramente a ação da GLO. Temos a convicção de que a GLO tem inibido a prática de diversos ilícitos ambientais.

Ministro, o Brasil passa por uma situação fiscal complicada. Recentemente, o governo federal teve que contingenciar o orçamento. Como ficam as Forças Armadas nesse cenário?
O orçamento das Forças Armadas é uma das prioridades da minha gestão. Digo isso porque as nossas Forças precisam ser fortes e bem preparadas para cumprir sua missão de defender o Brasil e apoiar a sociedade brasileira sempre que forem requisitadas. O trabalho dos militares da Marinha, do Exército e da Força Aérea é, muitas vezes, silencioso. Manter a paz e a estabilidade exige isso, o que nem sempre é percebido pelo cidadão comum. As Forças entendem as dificuldades fiscais enfrentadas pelo país. Elas têm consciência do seu papel neste momento, mas não podem perder a capacidade de pronta resposta, nem interromper o processo de modernização que vêm construindo com seus projetos estratégicos. Até porque, investir nas Forças Armadas também é gerar empregos, renda, captar tributos e aumentar a pauta de exportações com a venda dos produtos de Defesa, ou seja, é movimentar a economia nacional. O presidente Jair Bolsonaro e o Ministério da Economia têm exata noção dessa realidade.

As Forças Armadas têm sido chamadas para atuar em diversas situações. Em Pernambuco, uma dessas já dura bastante tempo: é a Operação Carro-Pipa.
Exatamente. Em 1998, o Exército Brasileiro foi convocado de forma emergencial para combater os efeitos da seca sobre a população nordestina na chamada Operação Carro-Pipa. Mas como a seca no semiárido brasileiro é cíclica, a operação dura até hoje. São quase 600 municípios beneficiados em nove estados, dentre eles Pernambuco. Além de realizar o planejamento para a distribuição emergencial da água potável, o Exército faz a vistoria e a fiscalização das condições dos carros-pipa contratados, da quantidade de água distribuída, das distâncias percorridas e da execução dos planos de trabalho dos mais de quatro mil carros-pipa contratados.

Além de mais recursos para as Forças Armadas, o senhor colocou como prioridade da sua gestão a questão da reestruturação da carreira dos militares. Por que isso é importante?
Porque as Forças Armadas têm no seu pessoal a sua maior riqueza. No entanto, devido às exigências inerentes à profissão militar e à defasagem em relação a outras carreiras de Estado, tornou-se pouco atraente seguir a carreira das Armas. Lembrando que a carreira militar exige disponibilidade permanente e dedicação exclusiva. Além do que não tem uma série de direitos concedidos aos demais trabalhadores da iniciativa privada e a outros servidores públicos. Militar não pode se associar, fazer greves, não tem hora-extra, fundo de garantia, adicional noturno, periculosidade, por exemplo. Muitos militares acabam optando por fazer outro concurso e deixar as Forças. Acompanhando o processo de modernização das Forças Armadas, surgiu a necessidade de uma reforma administrativa, que culminou com o PL 1645, que moderniza o Sistema de Proteção Social das Forças e reestrutura a carreira militar.

É reajuste salarial?

Não. O PL 1645 não é um aumento salarial. Representa mais uma contribuição para o esforço fiscal que o governo está fazendo e uma reestruturação de carreira com foco na meritocracia e na retenção de talentos. O PL 1645 vai valorizar a carreira militar. É importante lembrar que, pela primeira vez, um projeto de reestruturação de carreira é encaminhado ao Congresso Nacional apresentando receitas e despesas e gerando superávit.

Vai significar mais gastos para a União?
De forma alguma. A proposta foi elaborada criteriosamente em conjunto com o Ministério da Economia. Os estudos começaram em 2016 e só foram concluídos neste ano. Se o projeto não fosse autossustentável, não passaria pelo crivo do ministro Paulo Guedes.  O PL 1645 prevê uma economia de cerca de R$ 10 bilhões em dez anos.

De onde virá a receita para garantir esse superávit?
Juntamente com o sacrifício do país, os militares também se sacrificarão, pois terão o aumento do tempo de serviço de 30 anos para 35 anos; o aumento da alíquota de contribuição; a universalização das contribuições, com a inclusão de pensionistas e alunos das escolas de formação e a alteração nas idades-limite para a transferência para a reserva remunerada e para a reforma. E olha que nós nem colocamos na conta o fato de que o Estado já economiza muito em razão do não-pagamento de direitos remuneratórios, tais como hora-extra e adicional noturno, que são devidos ao trabalhador comum, mas não aos militares. A estimativa é que o não-pagamento desses direitos gere, só em 2019, por exemplo, uma economia de R$ 23,5 bilhões.