DIARIO ESPORTIVO » Preto

por Fred Figueiroa
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Publicação: 19/09/2020 03:00

A noite de sexta-feira tornou-se um capítulo da história do futebol de Pernambuco. Pela primeira vez em 119 anos o Náutico entrou em campo inteiramente vestido de preto. Camisa, calção e meião. Até o escudo trazia o preto no lugar do vermelho. Por maior que tenha sido o impacto da mudança estética, o verdadeiro e consistente impacto já havia se multiplicado pelas redes sociais do país horas antes da partida. O vídeo de lançamento da camisa foi muito além de uma ação de marketing. Muito mesmo. Foi além, inclusive, da divulgação do movimento Vidas Negras Importam. O conteúdo mergulhou nas entranhas do clube, quebrou tabus e paradigmas e foi extremamente corajoso para reconhecer um erro histórico. O vídeo resgata capítulos racistas da própria história alvirrubra. Do racismo institucional que proibia a presença de jogadores negros nas primeiras décadas do futebol no estado ao racismo dos torcedores que, em 2001, ecoavam gritos simulando macacos para agredir o então goleiro do Santa Cruz, Nilson.   

O impacto histórico da mensagem se transforma em emoção ao apresentar a camisa preta com a frase “Vidas Negras Importam” sendo vestida pelo próprio Nilson. A ação mexeu até mesmo com torcedores do Sport e do Santa Cruz. Foram centenas de mensagens exaltando o contundente, corajoso e exemplar posicionamento histórico do Náutico. Uma desconstrução está em curso no clube - que durante tantos anos carregou com estranho e questionável orgulho termos como “elite” e “aristocrático”. O presidente Edno Melo já havia demonstrado incômodo com essa imagem e, ao endossar a nova camisa e tudo o que envolveu a campanha de lançamento, deu um passo institucional histórico - além de uma enorme contribuição para o necessário debate sobre o racismo no futebol e em toda a sociedade.

A primeira ideia

Em meio à gigantesca repercussão nacional da camisa preta do Náutico veio a público a informação de que o uniforme, na verdade, havia sido planejado para ser usado apenas pelos goleiros alvirrubros - e que, excepcionalmente, o Conselho do clube autorizou que fosse usado como padrão da equipe apenas no primeiro tempo da partida de ontem. Porém depois de toda a aprovação popular - e de um recorde absoluto de vendas - será um erro estratégico enorme reduzir a camisa para uma simples peça de goleiro. Até porque já existiram outras versões pretas no próprio clube. Cabe ao Deliberativo, com urgência, aprovar a transformação em uniforme oficial.

A volta do público

A Prefeitura do Rio decidiu liberar o público nos jogos de futebol a partir do dia 4 de outubro. Disputando a reeleição, Marcelo Crivella utilizou o insólito argumento que reabrir os estádios (com 30% da capacidade) pode ser uma forma de diminuir a aglomeração das praias. Enfim, esta é uma discussão maior e que fica para outro texto. O fundamental neste momento é que a CBF garanta condições iguais de disputa para todos os clubes. É um absurdo autorizar a volta da torcida apenas em uma cidade e sem considerar o número de rodadas de cada clube como mandante.