Movimentos sociais dão a mão às famílias Moradores de favelas têm espaços para debater sobre segurança e outros temas relacionados a direitos humanos

Publicação: 29/06/2019 03:00

Na favela carente de políticas públicas, quem costuma “dar a mão” são os movimentos surgidos entre os próprios moradores. A organização desses espaços de debate acontece a partir da observação da realidade do povo da comunidade; da necessidade de amenizar dores tão parecidas. O Coletivo Ibura mais cultura, por exemplo, ganhou voz há dois anos, a partir da iniciativa de homens e mulheres, a maioria pessoas negras e LGBTTs do bairro, preocupados com a imagem do Ibura, sempre retratado pela violência. Surgia a necessidade de lançar um novo olhar sobre o espaço onde viviam e de dialogar com a juventude vulnerável ao tráfico e à violência.

Nas reuniões, as conversas giram em torno de cultura e outros temas relacionados a direitos humanos, como gênero, sexualidade e racismo. “Na favela, nós temos uma repressão policial muito grande. Mas a gente orienta de acordo com o que cada situação permite. É importante saber que nem sempre conhecer e saber de nossos direitos vai nos blindar da violência estatal. Como dizer, por exemplo, que um policial está violando minha intimidade ao pegar meu celular?”, pontua Lídia Lins, do Ibura mais cultura.

O coletivo foi um dos participantes da Marcha da maconha, deste ano, no Recife, movimento antiproibicionista que luta por uma nova política de drogas, focando na atenção na saúde dos usuários e contra o encarceramento da juventude negra e periférica. “A discussão sobre o consumo de drogas é moralista. O uso em si da droga não é ruim, pois ela proporciona sensações boas e o uso é feito coletivamente. O ruim é a forma como a sociedade lida com isso. Ninguém chega para o adolescente e tem uma discussão aberta. Diz apenas que é ruim. Mas quando o adolescente consome, vê que aquilo é bom. Precisamos de um debate aberto e sincero sobre drogas. Legalizar apenas não acaba com o tráfico. É preciso ver como regulamentar isso. Mas a proibição por si só também só gera morte e encarceramento”, analisa Lídia.

Em Peixinhos, o Grupo Comunidade Assumindo suas Crianças surgiu há 33 anos em meio aos números altos de assassinatos de crianças e adolescentes do bairro olindense no período de introdução das drogas no bairro. Três décadas depois, as histórias se repetem. Raquel Ayres é jovem multiplicadora no projeto Mães da saudade, desenvolvido dentro do grupo. Apesar de muito jovem e sem filhos, é ela quem ajuda 55 mães vítimas da violência letal no bairro a “transformar luto em luta”, como costuma dizer.

A colega, Fernanda Alves, 26, atua como educadora no grupo em uma parceria com o Centro Luiz Freire. Ele atende a crianças na primeira infância, de zero a dois anos, juntamente com os pais, no horário da manhã. “A ideia é ter um momento entre pais e filhos. Eles não deixam os filhos e vão embora. Aqui também debatemos  a prevenção da violência.” Segundo ela, os moradores de bairro têm três creches municipais, mas elas não dão conta. Há pessoas que dormem na frente do serviço para conseguir uma vaga.