ACERTO DE CONTAS » Temos uma nova Telexfree

Pierre Lucena
pierre.lucena@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 24/08/2019 03:00

Mesmo depois da intervenção da Telexfree, toda semana aparece uma pirâmide financeira nova no mercado. Desta vez é uma empresa chamada Youx Wallet
 
Para quem não se lembra, no ano de 2013 uma enorme fraude financeira funcionou no Brasil. Conhecida como Telexfree, um grande esquema de pirâmide se formou sob a forma de um possível produto de voz sobre IP, prejudicando mais de um milhão de pessoas que caíram (ou participaram) do golpe. Este provavelmente foi o caso mais extenso de fraude financeira da história do país.

Ao mesmo tempo em que a Telexfree funcionou, dois outros sistemas de pirâmides apareceram: o BBOM e a Priples. O primeiro era um sistema parecido com o marketing multinível de rastreadores de carros e o segundo era um esquema bizarro de fraude, onde você recebia até 60% ao mês de retorno sobre seus investimentos.

A Priples, para quem não se lembra, era um Esquema Ponzi genuinamente pernambucano. Seu fundador foi preso em 2013 e em sua residência encontraram R$ 70 milhões. Mais de 200 mil pessoas entraram na empresa, onde a remuneração se dava apenas assistindo vídeos na internet.

A pirâmide financeira, ou Esquema Ponzi, é uma operação fraudulenta onde os novos entrantes remuneram os antigos. A remuneração é sempre muito superior ao mercado e atrativa para que as pessoas continuem reinvestindo sem a percepção de que participam de uma fraude. Para que se prolongue, mais pessoas precisam participar.

O novo argumento para remunerações atípicas está no uso de novas modalidades de tecnologia que ainda não conseguem ser facilmente precificadas. Na prática é apenas uma cortina de fumaça para que desavisados entrem na fraude sem saber o que está acontecendo. Foi assim com a Telexfree e a Priples.

E não podia ser diferente. Todos os meses temos notícias de novas pirâmides surgindo no mercado, mas uma particularmente me chamou a atenção: a Youx Wallet.

A tal pirâmide promete ganhos extraordinários através de criptomoedas supostamente negociadas pela empresa. A Youx Wallet nada mais é do que uma Telexfree com uma roupagem mais moderna e muito mais agressiva.

Você adquire um plano que remunera até 3% ao dia. Um dos divulgadores chega a falar em até 36.000% em 200 dias. Nem mesmo o tráfico de drogas paga tanto de retorno.

Em comum com a Telexfree temos várias “coincidências”.

A primeira delas é o discurso de ganho fácil com algo desconhecido. A atração de pessoas com a promessa de ganhos extraordinários é muito antiga, mas sempre funciona. Em 2013 era o VOIP e agora é a criptomoeda.

O segundo fato é que o dono da nova empresa era um dos maiores divulgadores da Telexfree. Amealhou milhares de pessoas que entraram na pirâmide e perderam tudo. Está agora liderando esta enorme fraude que obviamente terá o mesmo fim.

Por fim, o modelo de captura das pessoas é exatamente o mesmo: amigos próximos, normalmente em ambientes de muita comunhão, como igrejas. Prolifera também com muita força em cidades menores.

Para quem não se lembra, a Telexfree chegou a ter 20% da população economicamente ativa do Acre em sua rede. Não foi à toa que a ação que suspendeu suas atividades se deu na Justiça do Acre.

O finado blog Acerto de Contas falou deste fenômeno por diversas vezes, sendo alvo de um ataque, juntamente com o blog de Luis Nassif, e teve dificuldades para continuar operando. No fundo provamos que estávamos certos, mas o modelo fraudulento continua funcionando como se fosse novidade. Cheguei a receber e-mails de todo o Brasil. Dois casos me chamaram a atenção: um comerciante do Acre chegou a vender seu posto de gasolina para colocar o dinheiro na Telexfree e outra pessoa vendeu dois táxis para investir. Os dois ficaram sem nada e um tentou o suicídio.

A Justiça precisa ficar atenta antes que a teia fraudulenta se espalhe com força. A CVM já avisou que não há licença para funcionar. Falta agora uma atitude mais concreta.