A crise da maconha no Recife
Pessoas que fazem uso recreativo - vetado por lei - reclamam do sumiço da erva, também em falta para fins terapêuticos
Silvia Bessa
silvia.bessa@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 08/02/2020 03:00
O Recife enfrenta uma inusitada crise de abastecimento: falta maconha para atender o mercado consumidor. Trata-se de um comércio essencialmente ilegal, alimentado pelo crime organizado, mas o produto desapareceu também para quem o utiliza com fins terapêuticos. O tema ganhou destaque nas redes sociais, inspirou memes e é impulsionado por grupos de WhatsApp, usuários de diferentes classes sociais, mães e pais, médicos que prescrevem maconha para amenizar dores e por autoridade policial. É o Recife que ninguém vê em modo público. Nesta semana o mercado da maconha ficou mais agitado e inflacionado.
Na última terça-feira, uma operação conjunta da Polícia Federal e Polícia Militar erradicou no município de Cabrobó, Sertão de Pernambuco, 10.240 pés de Cannabis, base da maconha. Foi a primeira ação do ano. Os 10.240 pés de maconha foram incinerados. Se transformados para a venda, o volume chegaria a 3.400 quilos. A repercussão no caso do uso recreativo ou social cresce com a proximidade do carnaval; o eco das famílias de usuários da área medicinal se fortalece na pouca regulamentação e no desespero dos pacientes sem o atenuante para crises convulsivas ou de dores agudas. No Brasil, a Lei Antidroga - nº 11.343, de 2006 - diz que o uso de substâncias ilícitas é crime e estabelece penas para quem “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal”, mas estabelece punições diferentes para o consumidor e o traficante. O simples uso não é crime. Cabe, no entanto, ao juiz decidir o que configura tráfico; e ele pode definir por apenas um cigarro.
“Não tem em lugar nenhum”, diz Gilvan Glibson, 43 anos, professor, biólogo sanitarista e usuário. Gilvan, que trabalha com ONG voltada para crianças e mulheres, diz que já se nota aumento da violência doméstica. “Queimar grandes plantações de maconha em ações de combate é um ato ignorante. Poderiam ganhar valores incalculáveis com a exportação”.
Segundo Ingrid Farias, pesquisadora da área de encarceramento, gênero e drogas, integrante da Marcha da Maconha e da Escola Livre de Redução de Danos, “a escassez é vista em todo o mercado de varejo”. Mas - frisa - a classe média dá um jeito e compra. “Já na periferia, estão vendendo ritalina e rivotril como alternativa, o que pode ser mais danoso”. Pontua que este foi o resultado de “uma ação mais articulada da polícia, ou da ponta da segurança pública, muito mais incisiva e violenta”, estabelecendo uma relação direta entre a operação das polícias no Sertão e a crise no mercado da maconha.
Pai de uma criança com autismo que utiliza óleo canabidiol e presidente da Associação Canábica Medicinal de Pernambuco (Cannape), Eduardo Dantas da Costa Júnior não só confirma a agitação do mercado como fala da expectativa de urgência dos associados quanto à normalização do acesso à maconha. “Temos uma mãe de paciente que procura maconha loucamente para o tratamento recomendado para o filho. Ele tem epilepsia e colocou um marca-passo. A recomendação recente é que a criança inale maconha vaporizada a 200% (um terço da concentração comum) para melhorar as dores. A maconha é fundamental para a vida dele e há mais de um mês que eu digo para ela que não sei quem pode conseguir”, relata. Fundada em 2017, a Cannape atende cerca de 70 famílias.
Evolução do cerco à maconha em PE *
Pés erradicados
2019 - 1,18 milhão
2018 - 975 mil
2017 - 1,80 milhão
Plantios destruídos
2019 451
2018 416
2017 577
Mudas destruídas
2019 969
2018 401
2017 497
Maconha pronta
2019 - 4.746 kg
2018 - 1.906 kg
2017 - 4.115 kg
Maconha que deixou de ser produzida
596 toneladas
325 toneladas
397 toneladas
Na última terça-feira, uma operação conjunta da Polícia Federal e Polícia Militar erradicou no município de Cabrobó, Sertão de Pernambuco, 10.240 pés de Cannabis, base da maconha. Foi a primeira ação do ano. Os 10.240 pés de maconha foram incinerados. Se transformados para a venda, o volume chegaria a 3.400 quilos. A repercussão no caso do uso recreativo ou social cresce com a proximidade do carnaval; o eco das famílias de usuários da área medicinal se fortalece na pouca regulamentação e no desespero dos pacientes sem o atenuante para crises convulsivas ou de dores agudas. No Brasil, a Lei Antidroga - nº 11.343, de 2006 - diz que o uso de substâncias ilícitas é crime e estabelece penas para quem “adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal”, mas estabelece punições diferentes para o consumidor e o traficante. O simples uso não é crime. Cabe, no entanto, ao juiz decidir o que configura tráfico; e ele pode definir por apenas um cigarro.
“Não tem em lugar nenhum”, diz Gilvan Glibson, 43 anos, professor, biólogo sanitarista e usuário. Gilvan, que trabalha com ONG voltada para crianças e mulheres, diz que já se nota aumento da violência doméstica. “Queimar grandes plantações de maconha em ações de combate é um ato ignorante. Poderiam ganhar valores incalculáveis com a exportação”.
Segundo Ingrid Farias, pesquisadora da área de encarceramento, gênero e drogas, integrante da Marcha da Maconha e da Escola Livre de Redução de Danos, “a escassez é vista em todo o mercado de varejo”. Mas - frisa - a classe média dá um jeito e compra. “Já na periferia, estão vendendo ritalina e rivotril como alternativa, o que pode ser mais danoso”. Pontua que este foi o resultado de “uma ação mais articulada da polícia, ou da ponta da segurança pública, muito mais incisiva e violenta”, estabelecendo uma relação direta entre a operação das polícias no Sertão e a crise no mercado da maconha.
Pai de uma criança com autismo que utiliza óleo canabidiol e presidente da Associação Canábica Medicinal de Pernambuco (Cannape), Eduardo Dantas da Costa Júnior não só confirma a agitação do mercado como fala da expectativa de urgência dos associados quanto à normalização do acesso à maconha. “Temos uma mãe de paciente que procura maconha loucamente para o tratamento recomendado para o filho. Ele tem epilepsia e colocou um marca-passo. A recomendação recente é que a criança inale maconha vaporizada a 200% (um terço da concentração comum) para melhorar as dores. A maconha é fundamental para a vida dele e há mais de um mês que eu digo para ela que não sei quem pode conseguir”, relata. Fundada em 2017, a Cannape atende cerca de 70 famílias.
Evolução do cerco à maconha em PE *
Pés erradicados
2019 - 1,18 milhão
2018 - 975 mil
2017 - 1,80 milhão
Plantios destruídos
2019 451
2018 416
2017 577
Mudas destruídas
2019 969
2018 401
2017 497
Maconha pronta
2019 - 4.746 kg
2018 - 1.906 kg
2017 - 4.115 kg
Maconha que deixou de ser produzida
596 toneladas
325 toneladas
397 toneladas
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