Comércio insiste em abrir no Centro de Camaragibe Guarda Municipal e PM fecharam seis pontos. Vendedores julgam a restrição desnecessária

FILLIPE VILAR
ESPECIAL PARA O DIARIO
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Publicação: 03/04/2020 03:00

A Rua Eliza Cabral de Souza, no Centro de Camaragibe, estava com um fluxo alto de pessoas na tarde de ontem, apesar das medidas de isolamento social adotadas pelo Governo de Pernambuco. A preocupação com o coronavírus não impediu algumas lojas de abrirem as portas na via. A situação era tão grave que, no momento em que a equipe do Diario chegou, um grupo de fiscais da prefeitura, junto com policiais militares e a Guarda Municipal, fechava estabelecimentos que insistiam em abrir. Dois carros de som estavam no local, reproduzindo um aviso da prefeitura que pedia para as pessoas não saírem de casa.

Os policiais e agentes públicos, de máscaras, notificaram os donos de lojas que por descumprimento do decreto. Os pequenos lojistas, irritados com a situação, abordaram a reportagem do Diario. Nenhum usava máscara. “Mas a gente toma cuidados. Tenho um pote de álcool gel para limpar a mão”, disse um comerciante, que não quis se identificar, mostrando um pequeno frasco de plástico com o líquido antisséptico. Ele questionou a abordagem dos fiscais. “O vírus é sério, vai matar muita gente. Só que eu trabalho aqui há 16 anos e preciso levar dinheiro para minha casa todo dia. Vai morrer gente de coronavírus, mas se continuar essa situação, vai morrer de fome e de depressão”, afirmou.

Os donos das lojas que foram fechadas na ação estavam reunidos, reclamando do prejuízo. Fabio Luiz, 39 anos, tem um quiosque de conserto de celular. Para ele, a ajuda do governo federal, de R$ 600, não seria suficiente para compensar o tempo recomendado de isolamento. “O governo nunca pagou minhas contas. Por que pagaria hoje? Eu sou um cidadão, não sou bandido. Esse dinheiro não paga as contas que eu devo e as dívidas que eu vou fazer se ficar em casa”, disse.

José Renato, 58, tem uma loja de confecções na mesma rua. “Eu pago aluguel aqui do ponto e da minha residência. Estou nesse local há seis anos”, disse. Mora com a esposa, de 50 anos, e os dois filhos, um de 28 e o outro de 19. Para ele, o surto de coronavírus ocorreu no Brasil por falta de resposta das autoridades. “Ninguém cancelou o carnaval e o vírus apareceu aqui logo depois. Infelizmente isso já estava no mundo desde dezembro, era pra ter feito isso no começo do ano”, afirmou o comerciante.

Uma guarda municipal, não identificada, explicou a abordagem. “Nós fazemos uma ação diária, de rotina, para minimizar o descumprimento do decreto do governo do estado. Essa, além de ser uma rua comercial, é uma via local, fazendo que com que haja um grande fluxo de pessoas aqui. Estamos procurando evitar o aumento de aglomerações”, disse.

A Prefeitura de Camaragibe afirmou, por meio de nota, que a ação fechou seis estabelecimentos ontem. Durante a abordagem, os proprietários foram autuados e informados de que seriam encaminhados para a delegacia caso houvesse reincidência. “O nosso objetivo é fazer com que os comerciantes cumpram o decreto para evitar a circulação de pessoas. Só assim iremos combater a disseminação do novo coronavírus”, disse o diretor municipal de Controle Urbano, André Barbosa. De acordo com a gestão, o cidadão de Camaragibe pode denunciar estabelecimentos que estejam descumprindo as medidas restritivas por meio dos telefones do Controle Urbano do município: (81) 99781-0727 ou (81) 99945-8266.

HORÁRIO RESTRITO

O Mercado Público de Camaragibe tem funcionado apenas no período da manhã, de 5h às 12h, durante o isolamento social. Quando a equipe do Diario chegou, alguns poucos profissionais dos boxes de carne estavam cortando o produto, descarregando mercadorias e limpando os estabelecimentos. “De tarde a gente vem aqui para fazer a limpeza”, disse o açougueiro Riva da Silva de Oliveira, 43. “O movimento caiu muito, mas acho que o pessoal não tá levando muito a sério, não. Eu vejo gente cortando garrafa pet de refrigerante para usar como máscara”, alegou.

“Acho que essa doença está acabando com a gente, mas ninguém pode brincar com a vontade de Deus”, continuou Riva, que mora com a esposa, de 40 anos, e dois filhos, de 16 e 15. Fumante, o açougueiro disse que não teme a Covid-19. “Dois anos atrás eu fiquei 17 dias em coma por conta da doença do rato [leptospirose]. Fui para a sala vermelha duas vezes. Já sobrevivi a isso, tenho medo, mas eu sou jovem”, afirmou.