Olhando para o lado bom da vida Psicólogo encara os dias de isolamento social com atividades saudáveis, bom humor e evitando o excesso de informações sobre a pandemia

MARCIONILA TEIXEIRA
marcionila.teixeira@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 03/04/2020 03:00

Dia desses, Luiz Schettini, 84 anos, se viu cantando embaixo do chuveiro. Em meio à pandemia da Covid-19, ele, como pessoa idosa, decidiu mudar a forma de enxergar a doença. Já não lhe o cabe o excesso de notícias trágicas sobre o coronavírus. Em vez disso, se dedica a assistir às sessões de filme perdidas por conta do tempo dedicado ao trabalho no consultório de psicologia. Também vai retomar a escrita de dois livros, pendentes pelo mesmo motivo.

Psicólogo que também tem formação em filosofia e teologia, Luiz fez sucesso nas redes sociais nesta semana ao posar para uma foto captada pela companheira, Suzana, com uma camisa escrita assim: “Velho não! Seminovo”. Uma brincadeira, na verdade, para avisar sobre algo importante: viver a quarentena com leveza também contribui para a saúde mental. Principalmente quando falamos de idosos.

Na postagem, Suzana, que também é psicóloga, brinca ao dizer que “Luiz tem se disfarçado para enganar o coronavírus... Ou seria coroavírus? Não tira essa camisa de jeito nenhum!”. Desde então o casal vem conversando sobre a necessidade de dizer algo positivo para os idosos.

“Fica contraditório juntar pandemia com bom humor. Mas também é verdade que podemos entender o bom humor de forma mais consistente do que simplesmente a visão de superfície, do que é uma pessoa bem humorada. Humor tem a ver com subjetividade do indivíduo. E mesmo diante de situações sofridas, ele pode manter o bom humor. Não significa simplesmente através da expressão do riso, mas um bem estar, um olhar de leveza. Aliás, a leveza e a simplicidade ajudam a gente a olhar para situações nas suas diversidades, de forma que nos dão condições de enfrentá-las, não necessariamente de forma destruidora”, pontua.

Todo envelhecimento, diz Schettini, é rico, mesmo para os idosos em situação de sofrimento e limitações. “Todo idoso tem uma história. E a história não precisa ser agradável para ser boa. Até aquela que mostra momentos de sofrimento indica que a gente se superou. É preciso o sujeito ter consciência de que está vivo, mesmo passando por situações difíceis. Às vezes nem ele entende como sobreviveu a tudo aquilo. O idoso pode pensar que está sofrido agora, mas também dizer, ‘puxa, sobrevivi, tenho valores e resistência até maiores do que os de outras pessoas que não passaram o que eu passei.’”

Em meio ao bombardeio de informações sobre a Covid-19, onde se fala todo o tempo sobre as pessoas idosas como grupo de risco, é necessária uma mudança de postura tanto do idoso quanto das pessoas que o cercam. “O idoso gostaria, nesse momento, de duas coisas: ser acolhido e ser ouvido. Às vezes, os mais jovens dizem que escutam dos mais velhos a mesma história muitas vezes. Não se sintam entediados quando isso acontecer. Não pensem que ele não lembra que já contou. Ele repete a história simplesmente porque é boa”.

No caso do idoso em isolamento, é importante filtrar o noticiário sobre a doença. “Resolvi que iria assistir a todos os noticiários. Mas depois comecei a perceber que estava intoxicado com as mesmas coisas. O que mudava era apenas o número de infectados e de mortos. Preciso da informação , quero estar atualizado, mas aboli a maioria das notícias”, explica.

“Para o idoso, essa repetição só leva ao incômodo. Me sinto ótimo agora. Me vi cantando embaixo do chuveiro e achei formidável. Coisa que não fazia há muito tempo.”

Em termos cronológicos, o tempo de vida para um idoso pode se assemelhar à eternidade, teoriza Schettini. “A gente não tem noção do que significa eternidade porque ela traz para a gente a ideia de que não teve começo e não terá fim. O não ter fim não é difícil entender e a gente vai postergando. Mas não ter começo é inaceitável”, finaliza.

Saiba mais

Dicas para melhorar a vida do idoso na quarentena

  • É possível manter o distanciamento social e aproveitar as horas livres para fazer exercícios físicos, atividades de lazer ou botar o papo em dia com os amigos em uma vídeo chamada pelo celular

  • O que não pode, segundo os especialistas, é ficar sentado o dia inteiro no sofá assistindo a TV e comendo mais do que deve, principalmente alimentos industrializados

  • O geriatra Paulo Camiz, do Hospital das Clínicas de São Paulo, ressalta que exercícios de alongamento, de equilíbrio e de força, para quem pode, são possíveis de fazer na sala, por exemplo. Até o corredor ou os batentes das portas podem ser aliados na atividade física.

  • Segundo o personal trainer Luiz Américo Bravo, é importante o idoso ficar atento às limitações de seu corpo neste momento

  • As atividades não são indicadas para quem tiver problemas nas articulações ou de mobilidade

  • Outro ponto de atenção importante é retirar do local onde for se exercitar qualquer móvel, objeto ou tapetes que possam provocar um acidente.

  • Para quem não pode se exercitar com o corpo, o geriatra recomenda exercícios para a mente. O ideal é fazer algo que desafie sua mente mais do que assistir a TV

  • O geriatra Paulo Camiz recomenda sudoku palavras-cruzadas, ou caça-palavras. No celular, também é possível baixar aplicativos com jogos para ativar o cérebro, como o Mente Turbinada

  • Os jogos de tabuleiro, de cartas ou o dominó ajudam na interação familiar

  • Outro cuidado que os idosos devem ter durante a quarentena é com a alimentação

  • A nutricionista Hanna Ferraz Martiniano ressalta que estocar comida pode ser uma cilada para uma alimentação saudável

  • Além de correr o risco de perder a validade, bolachas, salgadinhos e congelados, por exemplo, não têm os nutrientes necessários (Folhapress)