A luta de uma família que clama por justiça Dois meses após tragédia, parentes de trabalhador morto em acidente na Refinaria Abreu e Lima buscam transformar caso num marco no direito brasileiro

GABRIEL TRIGUEIRO
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Publicação: 27/11/2021 07:45

Uma dor que só aumenta e uma luta que está apenas começando. Dois meses após a morte do instrumentista Audo Alves da Hora, 38, num acidente na Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Ipojuca, a família dele busca justiça enquanto enfrenta dificuldades financeiras e emocionais. Audo, que trabalhava há oito meses numa empresa terceirizada, morreu ao ser atingido por um jato de ar comprimido quando consertava uma torre de tratamento que não deveria estar pressurizada. O trabalhador teve seu corpo arremessado, sofreu politraumatismos e ficou com o rosto desfigurado.

Casado e pai de duas filhas, uma delas com síndrome de Down, ele era o sustentáculo da família, que alega estar desamparada pela Petrobras e pela QWS, companhia com a qual Audo tinha vínculo direto. Os parentes estão processando as empresas por danos materiais e morais. O escritório de advocacia responsável busca transformar o caso num marco no direito brasileiro, onde as indenizações por acidentes de trabalho ainda são baixas em comparação aos Estados Unidos, por exemplo.

A perda de Audo chocou a cidade de Chã de Alegria, a 54km do Recife, onde ele vivia. No dia de seu enterro, que foi acompanhado por cerca de 500 pessoas, o comércio fechou. “Audo era caçula de 13 irmãos e era um filho para mim. Tudo que fazia era para ajudar sua família. Quero justiça porque a Petrobras tem que entender que está trabalhando com vidas, não com robôs”, diz a irmã dele, a microempresária Maria da Hora.

Ela destaca que o sofrimento da família foi agravado pelas informações desencontradas no dia do acidente, 27 de setembro. Segundo Maria, os parentes não receberam notícias das empresas e ficaram à mercê de grupos de WhatsApp. “A esposa de Audo, Mônica, passou mal ao saber do acidente e foi atendida num posto de saúde. Lá, recebeu a informação de que ele havia sido reanimado. Rezou e agradeceu a Deus, mas quando chegou em casa, soube da verdade”, conta.

O Sindipetro denuncia que  más condições de trabalho estariam custando vidas nas instalações da Petrobras. Somente em setembro, três petroleiros morreram num intervalo de 48 horas. Dois outros operários faleceram na Bacia de Campos (RJ).

Em 25 de setembro, Erick Gois, 26, participava de um treinamento quando foi atingido por um cabo. No dia seguinte, André Pereira, 48, morreu de Covid-19. Com sintomas graves, ele foi retirado da plataforma direto para a UTI.

Coordenador do sindicato, Rogério Almeida alerta para a insuficiência de investimentos em segurança. “A empresa está priorizando somente os lucros. Há constantes acidentes e falta treinamento. Há muita pressão para resolver as coisas rapidamente”, explica. Segundo ele, as condições têm sido mais difíceis para os terceirizados - 65% da força de trabalho atual da Petrobras. Audo recebia R$ 2 mil para desempenhar funções de risco. “Essas pessoas estão ganhando pouco, cheias de dívidas, e não estão trabalhando no seu ‘melhor eu’”, acrescenta Almeida.  

Em nota, a Petrobras afirma que prestou o apoio devido aos familiares de Audo e acompanhou o caso junto à QWS. “Não procedem afirmações sobre precarização. A Rnest opera de acordo com as normas de segurança  e cumpre rigorosamente a legislação trabalhista. A Petrobras tem como um de seus valores fundamentais o respeito à vida, às pessoas e ao meio ambiente”, diz o comunicado.

“A Petrobras promove a busca pela excelência em saúde e segurança e realizou este ano uma parada programada para manutenção da Rnest. Com um investimento de aproximadamente R$ 300 milhões, cerca de três mil pessoas atuaram em inspeções e manutenção de praticamente todos os equipamentos da unidade, tais como compressores, motores, vasos, permutadores de calor, válvulas, reatores e outros”, conclui a nota. A QWS não respondeu aos questionamentos da reportagem.