O legado maior de Vitalino
Obra do Mestre, que faria aniversário hoje, segue a exercer grande influência na identidade de Caruaru. Filho leva sua tradição adiante
ANAMARIA NASCIMENTO
anamaria.nascimento@diariodepernambuco.com.br
Publicação: 10/07/2018 03:00
Severino nasceu carregando uma responsabilidade. Chegou ao mundo em 4 de abril de 1940. Não era mais um Severino de Caruaru. Era o filho de Vitalino. O pai ainda não era Mestre, mas já tinha, 20 anos antes de o menino nascer, criado a banda Zabumba Vitalino, da qual era o tocador de pífano principal. Hoje, aos 78 anos, Severino conduz com orgulho a missão de dar continuidade ao legado do pai. Cuida, com os 13 filhos e 25 netos, do Museu Mestre Vitalino, o principal cartão postal do Alto do Moura. Aos 16 bisnetos, ainda está ensinando o que é ser um Vitalino.
Quando Severino fez sete anos, o Brasil e o mundo conheceram o trabalho do pai como ceramista, na época em que o desenhista Augusto Rodrigues organizou no Rio de Janeiro a 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana. Foi no mesmo ano que o menino começou a confeccionar os próprios brinquedos e ajudar o pai na produção de esculturas e louças de barro. Ao completar oito anos, foi como se a maioridade tivesse chegado. Passou a acompanha-lo à Feira de Caruaru para comercializar as criações em barro.
Edições do Jornal de Letras de 1953 e da revista Esso de 1959 foram guardadas pela família e comprovavam a fama do pai na cidade que os meninos Vitalino não viam pela televisão. O Rio de Janeiro parecia mais distante do que os dois mil quilômetros que o separam do Alto do Moura. Mestre Vitalino conquistou de vez os cariocas em 1960, quando participou da Noite de Caruaru, organizada por intelectuais da cidade, como os irmãos João e José Condé. As peças confeccionadas no Agreste pernambucano foram leiloadas para ajudar na construção do Museu de Arte Popular de Caruaru.
É graças ao pai de Severino que o Alto do Moura é considerado o maior centro das Américas de artes figurativas, que representam formas humanas, elementos da natureza e objetos criados pelo homem. “A arte figurativa que nos representa Brasil afora nasceu aqui, da arte do barro, ao som das bandas de pífano”, diz.
Quando Mestre Vitalino morreu, vitimado por varíola, em 20 de janeiro de 1963, aos 54 anos, Severino tinha 23 anos. A partida do pai fez a responsabilidade aumentar. Especializou-se em criar réplicas das obras que retratam o cotidiano nordestino, como banda de pífanos, trios de forró, bacamarteiros e vaqueiros. Ao todo, Mestre Vitalino deixou 118 variações de figuras em barro. “Mantenho a característica do trabalho do meu pai. As minhas são essas”, mostra Severino, apontando para as esculturas de barro cru, sem pintura. Ao lado delas, peças coloridas são expostas, mas foram produzidas pelos netos e bisnetos de Mestre Vitalino.
Para ouvir os fatos contados por ele mesmo, basta ir ao Museu Mestre Vitalino, no Alto do Moura (aberto todo dia, das 8h às 12h e das 14h30 às 17h), onde Severino espera visitantes diariamente. Aguarda na janela ou sentado em um banquinho, como fazia quando era criança, ansioso pelo retorno do pai, que voltava cheio de histórias do Rio de Janeiro.
Oportunidade
“Com 10 anos, comecei a trabalhar com barro. Nessa época, era uma brincadeira com meus pais. Paralelamente a isso, surgiu o Mestre Vitalino. Sou da geração que mantém as características do trabalho dele e se orgulha disso. Certa vez, fui à Feira de Caruaru tentar expor e vender minha arte. Só havia três barracas de artesanato em barro e eu não tinha uma para colocar meu trabalho. Vitalino abriu um espaço na dele e disse para eu colocar minhas peças lá. Uns americanos compraram. Consegui vender tudo graças à oportunidade que ele me deu”, relembra o artesão Luiz Antônio da Silva, 83.
A partir desse incentivo, o artesão não parou mais Já fez exposições no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Minas Gerais, na Alemanha e no Japão. “Em 1986, me levaram para Tóquio. Passei 46 dias lá, onde produzi 300 peças para os japoneses”, conta. Agora, Luiz produz em seu ateliê no Alto do Moura, como fazem os principais nomes do ofício na capital do Agreste.
Biografia
Décadas de 1900 a 1920
Vitalino Pereira dos Santos nasce em 1º de julho de 1909, em Caruaru. Filho de lavradores, ainda criança começa a modelar pequenos animais com as sobras do barro usado por sua mãe na produção de utensílios domésticos, para serem vendidos na feira de Caruaru. Ele cria a banda Zabumba Vitalino, da qual é o tocador de pífano principal. Muda-se para o Alto do Moura para ficar próximo ao Centro de Caruaru.
1947
Sua atividade como ceramista se torna connhecida do grande público quando o desenhista e educador Augusto Rodrigues (1913 - 1993) organiza, no Rio de Janeiro, a 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana. Nos anos seguintes, ganha destaque na imprensa nacional
1955
Integra a exposição Arte Primitiva e Moderna Brasileiras, em Neuchatel, Suíça. O Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais e a Prefeitura de Caruaru editam o livro Vitalino, com textos do antropólogo René Ribeiro e fotografias de Marcel Gautherot (1910 - 1996) e de Cecil Ayres. Nesta época, conhece Abelardo Rodrigues, arquiteto e colecionador, que forma um acervo de peças do artista, mais tarde doadas para o Museu do Barro de Caruaru.
1960
Viaja ao Rio e participa da Noite de Caruaru, organizada por intelectuais como os irmãos João Condé e José Condé. Suas peças são leiloadas em benefício da construção do Museu de Arte Popular de Caruaru, atual Museu do Barro. Participa de programas de televisão e exibições musicais. Recebe diversas homenagens como a Medalha Sílvio Romero.
1961
Atendendo a pedido da Prefeitura de Caruaru, doa cerca de 250 peças ao Museu de Arte Popular.
1971
Oito anos após a morte do ceramista, é inaugurada no local onde ele residia, no Alto do Moura, a Casa Museu Mestre Vitalino. No espaço, administrado pela família, estão expostas suas principais obras, além de objetos de uso pessoal, ferramentas de trabalho e o rústico forno a lenha em que fazia as queimas.
FONTE: Enciclopédia Itaú Cultural
Quando Severino fez sete anos, o Brasil e o mundo conheceram o trabalho do pai como ceramista, na época em que o desenhista Augusto Rodrigues organizou no Rio de Janeiro a 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana. Foi no mesmo ano que o menino começou a confeccionar os próprios brinquedos e ajudar o pai na produção de esculturas e louças de barro. Ao completar oito anos, foi como se a maioridade tivesse chegado. Passou a acompanha-lo à Feira de Caruaru para comercializar as criações em barro.
Edições do Jornal de Letras de 1953 e da revista Esso de 1959 foram guardadas pela família e comprovavam a fama do pai na cidade que os meninos Vitalino não viam pela televisão. O Rio de Janeiro parecia mais distante do que os dois mil quilômetros que o separam do Alto do Moura. Mestre Vitalino conquistou de vez os cariocas em 1960, quando participou da Noite de Caruaru, organizada por intelectuais da cidade, como os irmãos João e José Condé. As peças confeccionadas no Agreste pernambucano foram leiloadas para ajudar na construção do Museu de Arte Popular de Caruaru.
É graças ao pai de Severino que o Alto do Moura é considerado o maior centro das Américas de artes figurativas, que representam formas humanas, elementos da natureza e objetos criados pelo homem. “A arte figurativa que nos representa Brasil afora nasceu aqui, da arte do barro, ao som das bandas de pífano”, diz.
Quando Mestre Vitalino morreu, vitimado por varíola, em 20 de janeiro de 1963, aos 54 anos, Severino tinha 23 anos. A partida do pai fez a responsabilidade aumentar. Especializou-se em criar réplicas das obras que retratam o cotidiano nordestino, como banda de pífanos, trios de forró, bacamarteiros e vaqueiros. Ao todo, Mestre Vitalino deixou 118 variações de figuras em barro. “Mantenho a característica do trabalho do meu pai. As minhas são essas”, mostra Severino, apontando para as esculturas de barro cru, sem pintura. Ao lado delas, peças coloridas são expostas, mas foram produzidas pelos netos e bisnetos de Mestre Vitalino.
Para ouvir os fatos contados por ele mesmo, basta ir ao Museu Mestre Vitalino, no Alto do Moura (aberto todo dia, das 8h às 12h e das 14h30 às 17h), onde Severino espera visitantes diariamente. Aguarda na janela ou sentado em um banquinho, como fazia quando era criança, ansioso pelo retorno do pai, que voltava cheio de histórias do Rio de Janeiro.
Oportunidade
“Com 10 anos, comecei a trabalhar com barro. Nessa época, era uma brincadeira com meus pais. Paralelamente a isso, surgiu o Mestre Vitalino. Sou da geração que mantém as características do trabalho dele e se orgulha disso. Certa vez, fui à Feira de Caruaru tentar expor e vender minha arte. Só havia três barracas de artesanato em barro e eu não tinha uma para colocar meu trabalho. Vitalino abriu um espaço na dele e disse para eu colocar minhas peças lá. Uns americanos compraram. Consegui vender tudo graças à oportunidade que ele me deu”, relembra o artesão Luiz Antônio da Silva, 83.
A partir desse incentivo, o artesão não parou mais Já fez exposições no Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Minas Gerais, na Alemanha e no Japão. “Em 1986, me levaram para Tóquio. Passei 46 dias lá, onde produzi 300 peças para os japoneses”, conta. Agora, Luiz produz em seu ateliê no Alto do Moura, como fazem os principais nomes do ofício na capital do Agreste.
Biografia
Décadas de 1900 a 1920
Vitalino Pereira dos Santos nasce em 1º de julho de 1909, em Caruaru. Filho de lavradores, ainda criança começa a modelar pequenos animais com as sobras do barro usado por sua mãe na produção de utensílios domésticos, para serem vendidos na feira de Caruaru. Ele cria a banda Zabumba Vitalino, da qual é o tocador de pífano principal. Muda-se para o Alto do Moura para ficar próximo ao Centro de Caruaru.
1947
Sua atividade como ceramista se torna connhecida do grande público quando o desenhista e educador Augusto Rodrigues (1913 - 1993) organiza, no Rio de Janeiro, a 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana. Nos anos seguintes, ganha destaque na imprensa nacional
1955
Integra a exposição Arte Primitiva e Moderna Brasileiras, em Neuchatel, Suíça. O Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais e a Prefeitura de Caruaru editam o livro Vitalino, com textos do antropólogo René Ribeiro e fotografias de Marcel Gautherot (1910 - 1996) e de Cecil Ayres. Nesta época, conhece Abelardo Rodrigues, arquiteto e colecionador, que forma um acervo de peças do artista, mais tarde doadas para o Museu do Barro de Caruaru.
1960
Viaja ao Rio e participa da Noite de Caruaru, organizada por intelectuais como os irmãos João Condé e José Condé. Suas peças são leiloadas em benefício da construção do Museu de Arte Popular de Caruaru, atual Museu do Barro. Participa de programas de televisão e exibições musicais. Recebe diversas homenagens como a Medalha Sílvio Romero.
1961
Atendendo a pedido da Prefeitura de Caruaru, doa cerca de 250 peças ao Museu de Arte Popular.
1971
Oito anos após a morte do ceramista, é inaugurada no local onde ele residia, no Alto do Moura, a Casa Museu Mestre Vitalino. No espaço, administrado pela família, estão expostas suas principais obras, além de objetos de uso pessoal, ferramentas de trabalho e o rústico forno a lenha em que fazia as queimas.
FONTE: Enciclopédia Itaú Cultural