O brega que habita nosso cotidiano Em cartaz de amanhã a sábado no Teatro Apolo, Ritmo kente explora as diversas fases e facetas do ritmo pernambucano

EMANNUEL BENTO
emannuelbento@gmail.com

Publicação: 12/09/2018 03:00

Rádios, programas de auditório na TV, carros de som na rua ou plataformas digitais. Não importa o meio, o brega tem habitado, mesmo que indiretamente, o cotidiano dos pernambucanos nas últimas cinco décadas. Essa “memória afetiva” desenvolvida com o ritmo serviu como mote para a idealização de Ritmo kente, uma comédia-musical que revisita hits do gênero tendo como pano de fundo uma competição de dançarinas. Após a estreia em 2017, o espetáculo da Onz& Produções Artísticas ganha uma nova temporada no Teatro Apolo, no Bairro do Recife, de amanhã a sábado, sempre às 20h.

O enredo acompanha um concurso que decidirá a nova dançarina de palco do MC Kivara. A protagonista é Lady Gaga, que conta com o apoio da mãe Cher e da Amiga. Sua maior rival na competição é a vilã Fabíola, que fará de tudo para passar por cima dos demais candidatos. A história vai ganhando vida enquanto os atores cantam, ao vivo, diversos sucessos que sobrevoam a história do ritmo pernambucano, com direção musical de Douglas Duan e coreografias de Werison Fidelis.

Usando a classificação proposta pelo acadêmico Thiago Soares no livro Ninguém é perfeito e a vida é assim (OutrosCríticos, 2017), é possível dizer que Ritmo kente perpassa as três gerações do gênero: a primeira (dos homens românticos, capitaneada por ícones como Reginaldo Rossi e Labaredas), a segunda (com bandas lideradas por mulheres, como Ovelha Negra e Metade) e a terceira (MCs do brega-funk).

“A semente que originou a peça foi a ideia de revisitar a nossa a infância. Eu, por exemplo, fui muito influenciado por programas de auditório como Muito mais, da TV Jornal, e Tribuna show, da TV Tribuna. Eles ficaram registrados na minha memória afetiva e, como eu era criança, nada foi guardado pelo viés do preconceito”, diz Eric Ferreira, que assina o texto da obra ao lado de Hyrlis Leuthier e Amanda Clélia.

“Não foi muito difícil costurar um texto teatral com músicas do brega, pois todas elas contam histórias. Isso é muito importante em um musical, a música não pode ser acessória. Acabamos usando músicas como Perdoa-me, do Kelvis Duran, Milkshake, de Nega do Babado, e Como a culpa é minha, da Banda Torpedo”, afirma o artista.

Eric também conta que, na época da estreia, a música Só dá tu, da banda A Favorita, foi incluída no repertório de última hora por estar no auge. Dessa vez, eles pretendem usar os bordões da pernambucana Alcione Alves, que viralizou na internet narrando coreografia com expressões como “teile, zaga e laga”. “Adaptar a obra para as novidades é importante para adicionar esse tom de verdade. Sempre tivemos cuidado com a realidade nessa peça, pois não queríamos passar uma ideia de como se fosse uma classe média fazendo caricaturas da periferia.”

Toni Rodrigues, que assina a direção, reforça a ideia de que o espetáculo busca explorar a essência do brega de forma positiva: “Estudando o ritmo mais a fundo, percebemos que o mais forte dele é a poesia. Existe essa poesia que fala da periferia e tem comunicação direta com ela.” O diretor ainda afirma que a realização de uma peça teatral com o universo do brega reafirma a visibilidade que o ritmo alcançou em Pernambuco. “Ainda existe certo preconceito, mas o brega está na memória afetiva de todo pernambucano. É um movimento de periferia que se tornou um patrimônio cultural, não à toa. Fala de um povo, da cultura dessas pessoas e de um jeito de viver.”

Serviço

Ritmo kente - Um brega de musical
Quando: amanhã, sexta e sábado, às 20h
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apólo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$ 30 e R$ 15 (meia), à venda no site Sympla ou na bilheteria do teatro