Dois clássicos da psicodelia no streaming Flaviola e o Bando do Sol (1974) e Rosa de sangue (1980), de Lula Côrtes, chegam às plataformas digitais após serem digitalizados pelo lendário Hélio Rozenblit

JOÃO RÊGO
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Publicação: 25/10/2021 03:00

Neste final de outubro, duas obras fundamentais da música brasileira poderão ser desfrutadas pelos usuários das plataformas de streaming. Trata-se dos discos Flaviola e o Bando do Sol (1974), primeiro e único álbum do poeta, cantor e compositor recifense Flaviola, e Rosa de sangue (1980), do seu conterrâneo e também multiartista Lula Côrtes.  

Os projetos foram especialmente digitalizados pelo próprio engenheiro de som da época, o lendário Hélio Rozenblit, a partir da tape original, para não perder as sonoridades características. Enquanto o primeiro já se encontra disponível em plataformas como Spotify, Deezer, Tidal, Apple Music e no YouTube oficial da Rozenblit, o segundo chega na próxima sexta.

Representantes máximos da psicodelia pernambucana, ambos os discos são familiares ao universo dos amantes de vinil - ganhando, inclusive, reedições recentes em LP no Brasil. A chegada aos streamings, atualmente o principal meio de consumo musical, deve ampliar o alcance das obras, que já vinham sendo incluídas em movimentos de redescobertas pelas novas gerações.

A data também é oportuna como uma homenagem: Flaviola faleceu de Covid-19 em junho deste ano. Em 2020, ainda pôde ver o seu clássico ganhar uma nova tiragem no Brasil, além da primeira em 1974. Antes disso, só internacionalmente em 2005 por um selo pirata sul-coreano, e em 2011, pelo inglês Mr. Bongo Records, que relançou todo o catálogo da SOLAR Records, responsável pelo projeto na época. No ano passado, ele também adicionou à sua discografia o CD Ex-tudo, uma espécie de acerto de contas com o Recife, do qual passou 25 anos longe.

Flaviola e o Bando do Sol continua sendo o magnum opus, não só da sua carreira, mas de uma embrionária psicodelia pernambucana da década de 70. Principalmente quando olhamos para os nomes que compuseram o “bando do sol”: Lula Côrtes (que assina a composição de algumas músicas), Paulo Rafael, Robertinho de Recife, Zé da Flauta, Fernando Amaral, Icinho, Glauce, Neuza e Gildo Moreno.

Unindo uma miscelânea de sons e instrumentos, como a viola de 12 cordas, bandolim, auto-harpa e flauta, o disco também ficou conhecido por explorar caminhos da psicodelia lírica. Excertos de Hamlet, poesias do espanhol Garcia Lorca, do russo Maiakóvski e da mineira Henriqueta Lisboa são reinventadas em uma musicalidade multifacetada - ao ouvinte resta embarcar em uma ambiência sonora e literária ao mesmo tempo.

Outra obra importante que chega aos streamings é Rosa de sangue, lançada cinco anos depois de Paêbirú (1980), clássico mais cultuado da carreira de Lula Côrtes, realizado ao lado de Zé Ramalho.  

Rosa de sangue é o primeiro disco solo de Lula, trazendo também um elenco galáctico com Alceu Valença, Paulo Rafael, Zé da Flauta, Agrício Noya e Zé Rosas. A obra expõe um pouco do momento transitório da época que permeou a indústria musical - algo que diz mais respeito ao entorno histórico, do que propriamente ao conteúdo do disco, propositalmente mais sujo e lisérgico.

O repertório do álbum, por exemplo, é uma simplificação do show solo que Lula apresentou no final de 1979 até o início de 1980, no Recife, Olinda e João Pessoa. A genialidade permanece intocada, em composições que fazem releituras de Luiz Gonzaga, Capiba e em instrumentais, como é Nordeste oriental e a canção que dá título ao álbum.