100 ANOS RáDIO CLUBE » Rádio Clube engajada na Segunda Guerra Emissora tinha "vigília cívica" com o objetivo de fiscalizar efeitos das transmissões de rádio alemãs

Silvia Bessa
silvia.bessa@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 16/07/2018 03:00

Vivia-se um estado de guerra e o Brasil fazia parte dela. A Rádio Clube, pela importância que tinha à época, precisava dar sua contribuição civil. E deu, em várias frentes. Diziam que a cidade do Recife estaria sendo espionada até mesmo por submarinos no cinturão da costa marítima. Se a população tinha de se preparar para o pior, era a hora de contar com a ajuda dos informes radiofônicos na função educativa. A ordem dizia que os moradores deveriam colar papel preto nas vidraças das janelas, arranjar Sobrepor para as luminárias e evitar reflexos. Quem resolvesse passear nas ruas após as 21 horas, precisava portar salvo-condutos. A Rádio Clube divulgava essas e outras regras semelhantes de utilidade pública.

Para economizar combustível, cada proprietário de automóvel tinha por obrigação saber usar um equipamento chamado de gasogênio, na parte superior do veículo. Era um quebra-galho para os anos da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que funcionava a partir da queima de carvão ou lenha, alternativa para a crise petroleira. “Tudo foi ensinado com eficácia pelo rádio, lidando com a massa cada vez maior, que se comprimia nas salas de visitas para sintonizar o aparelho”, conta o professor Luiz Maranhão Filho, em seus estudos sobre o rádio no Brasil.

Dentro da Rádio Clube, uma “vigília cívica”, conforme define o especialista, funcionava quase que constantemente. O objetivo era fiscalizar os efeitos das transmissões do rádio alemão, feitas em português e dirigidas ao Brasil por orientação de Paul Joseph Goebbels, ministro da Propaganda na Alemanha Nazista. O método usado era conhecido como “maricota”. Os alemães barravam as frequências da Rádio Clube, invadindo-as de forma potente quase como uma transmissão local.

Nesta ocasião, no Recife, havia tropas americanas na Base Aérea, que ficavam ao lado de soldados brasileiros. Para lidar com uma terra estranha, os americanos pediram para instalarem um clube-cassino. E ele acabou ficando instalado bem na Avenida Guararapes, estrategicamente localizado, em um prédio onde hoje se situa a sede dos Correios e Telégrafos. Chama a Rádio Clube. Queriam diversão.

Comandantes militares fizeram uma espécie de convocação. O locutor Ziul Matos, uma das estrelas da Clube, passou a ser o responsável pelas festas do chamado U.S.O, o cassino das festas americanas. Além de experiente, Ziul Matos tinha uma qualificação para o trabalho: falava muito bem o inglês. Como ele, faziam sucesso ainda as conhecidas “Três Marias”: Maria Tereza, Maria Luiza e Maria do Amparo, todas filhas da atriz Luiza de Oliveira. Cantavam “Andrew Sisters”, “espécie de coqueluche” da época, diz Maranhão Filho em seu Memória do Rádio (Editora Jangada, 1991).

O sucesso era tanto que foi necessário a Rádio Clube compor a própria orquestra de metais ao estilo americano. Para agradar aos estrangeiros, quem estava à frente dela era o pistonista Franz Zavazal que gostava de emplacar o jazz. Pela localização geográfica, muitos artistas que vinham dos EUA passavam pela emissora após visitar as tropas.

Para dar ânimo à tropa brasileira do contingente da Força Expedicionária na Itália, de modo inverso, a Rádio Clube levava mensagens de familiares a pracinhas por meio de uma espécie de canal exclusivo, com a ajuda da União Telegráfica Internacional. É um período em que se vê a Rádio Clube, a PRA-8, a Pioneira, em várias frentes.