100 ANOS RáDIO CLUBE » Radionovelas, décadas de sucesso Com o incentivo de Luiz Maranhão, molda-se nos anos de 1930 um modelo de negócio que massificou o rádio como meio de comunicação no Brasil

Silvia Bessa
silvia.bessa@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 17/09/2018 03:00

Tinha 18 anos quando foi convidada por Luiz Maranhão, homem de grande faro para talentos, a interpretar Sinhá Moça no rádio. Era uma releitura do romance de Mário Sette intitulado Senhora do Engenho. Dividiram o texto em sete episódios, de maneira que tomaria uma semana completa de transmissão da Rádio Clube de Pernambuco. A jovem Mercedes Del Prado, atriz pernambucana cujo nome de batismo era Mercedes Furtado Ramalho, titubeou. O ano: 1938. Com pouca experiência, ela temia não dar conta do papel principal de um modelo artístico novo para ela. Até então, Mercedes só atuara em palcos teatrais, conforme afirma em entrevista concedida à Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) em 1991. Acabou por aceitar o desafio.

Para Mercedes, Sinhá Moça foi a primeira novela do Brasil. Em várias entrevistas ela destacava o pioneirismo desta produção, conta o fundador e ex-chefe da Fonoteca, o radialista e pesquisador fonográfico Renato Phaelante. Mas, “há profundas controvérsias”, frisa ele, responsável por coordenar a coleta de importantes e históricos depoimentos de personagens símbolos para a memória do rádio no estado e no Brasil. Ziul Matos e Telga de Araújo, radioator e novelista respectivamente e também ícones daquela época, dão outra versão sobre o que se fez em 1938 em Pernambuco. Para eles, Sinhá moça e outras tentativas eram “peças teatrais adaptadas para o rádio”. Narra Phaelante que Luiz Maranhão Filho, jornalista e autor de Memórias do rádio (Editora Jangada, 1991), creê que a famosa radioatriz Mercedes Del Prado classifica como novela as peças com “cinco ou mais atos, radiofonizadas”.

Mas é inegável a importância de Sinhá Moça como precursora das radionovelas e de Mercedes como uma referência do início dos anos de 1940. Ela chegava a responder por vários papéis ao mesmo tempo e marcou uma era no radioteatro de Pernambuco, que começava a ser rabiscado e pensado como modelo de negócio. Sempre com brilhantismo, como destacou o jornalista Severino Barbosa, em 1984, em caderno especial publicado pelo Diario de Pernambuco. “Mercedes foi a madrasta ruim, a bruxa de branca de neve, a ladra, a mendiga, a feiticeira de risada sinistra, o menino levado a breca, a marafona da vida airada, saindo-se de tudo magnificamente bem”, descreveu.

O papel de boazinha dava-se a uma radioatriz portuguesa, conhecida por Polyana. Ela perdeu o posto no dia em que se recusou a atuar com um radioator iniciante, dando a oportunidade que Mercedes brilhar nos anos seguintes em Silêncio. Nas décadas de 1940 em diante foram muitos os nomes de sucesso.

Phaelante conta que em 1947 “o radioteatro da Rádio Clube de Pernambuco constituía-se um dos mais bem organizados departamentos”. Além de Polyana e Mercedes, destacavam-se Fernando Castelão, Hélio Peixoto, J. Austragésilo e Manuel Malta. Este era apenas o primeiro capítulo. As radionovelas tiveram vida longa, chegando ao auge nas décadas de 1950 e 1960. Sobre elas, há muitos capítulos e personagens a serem descobertos.