100 ANOS RáDIO CLUBE » O poder de uma rádio para o frevo Estudioso afirma em tese de doutorado em Música na Unicamp que Rádio Clube foi a grande difusora do frevo, "fundamental para o gênero no Brasil"

Silvia Bessa
silvia.bessa@diariodepernambuco.com.br

Publicação: 07/01/2019 03:00

Quem mora em Pernambuco sabe: de janeiro em diante, é hora da frevança. E, há cinquenta anos, a tradição era ainda mais enraizada. Pela Rádio Clube, emissora pioneira no Brasil, ouviam-se os acordes e Claudionor Germano entoando com o irreconhecível vozeirão dele: “Trezentos e sessenta e cinco dias tem o ano, mas, para o Carnaval, só temos três// É muito pouco// Que bom seria se pudesse ser um mês”, cantava no final da década de 1960. “No Carnaval, a gente bebe de graça, a gente dança de graça, beija de graça. Oferta barata, só me falta conquistar essa mulata”, completava a estrofe, ele, intérprete da música Festa Barata, de Diná de Oliveira e Fernando Oliveira. A canção era parte do LP do I Festival do Frevo promovido pela TV Rádio Clube, Canal 6 e PRA-8, gravado pela Mocambo com artistas diversos.

Claudionor começou a vida artística no Jet Clube, na Boa Vista, por volta dos 14 anos, como integrante do conjunto Diabos Verdes. Foi na Clube que ganhou destaque, levado por Ziul Matos. Para Claudionor, ícone artístico do estado, rei do Frevo, dono do título de Patrimônio Vivo de Pernambuco com mais de sessenta anos de carreira, a trajetória de sucesso teve dia, hora e local para se iniciar: 2 de outubro de 1947. Na Rádio Clube. Contou com a orientação do maestro Nelson Ferreira. Na emissora fez seu grande amigo, Capiba - de quem se orgulha ter gravado mais de 130 composições. Um feito inédito.

A Rádio Clube se tornou um berço promissor para muitos artistas do estado. Alguns deles, conseguiram se perpetuar por décadas na cena artística pernambucana e se projetar para o resto do Brasil. O fenômeno mereceu alguns estudos acadêmicos país afora. “O papel desempenhado pelo rádio, em especial a Rádio Clube de Pernambuco, foi de fundamental importância na divulgação do frevo e sua consolidação como gênero. Pode-se dizer que esse meio (a Clube) foi o grande difusor do meio em seu período de afirmação”, sentencia Leonardo Vilaça Saldanha, em sua tese de doutorado em Música pela Unicamp (SP), Frevendo no Recife. “Através de suas antenas, a música pernambucana ultrapassou fronteiras e virou moda”, enfatizou.

Numa análise sobre a atuação de artistas dos mais variados, Saldanha lembra que a emissora foi “o principal responsável pela assimilação de outras culturas musicais que terminam por influenciar posteriormente o frevo”. São influências que, destaca, chegam até o momento atual. O estudo do músico da universidade paulista faz um apanhado de relíquias de vários compositores e relembra a atuação da rádio desde a sua fundação, em 1919, até os tempos áureos em que orquestras eram montadas durante programas de auditórios e audições.

Foram muitos os nomes que fomentaram a audiência da Rádio Clube nesses 100 anos de atividade. No campo da música, vale menção para Capiba (o maior compositor de frevo do Brasil, autor de mais de 200 canções que embalam os carnavais do estado), Nelson Ferreira, Sivuca, Luiz Queiroga, Clóvis Paiva, Esmeralda Ribeiro, Samuel Campelo, Alberto Figueiredo, Vicente Lacerda entre tantos outros cantores, apresentadores, produtores e instrumentistas.