PRIMEIRA INFàNCIA » Primeiros anos são determinantes Investimento em crianças de 0 a 6 anos de vida tem impacto no crescimento cognitivo, nas habilidades sociais e na saúde delas

Publicação: 01/06/2019 03:00

A empregada doméstica Lucélia Santos, 42, sempre quis ter uma filha. A segunda gestação era desejada, mas foi adiada por duas décadas. Os traumas deixados pela primeira gravidez, como a dificuldade para amamentar e encontrar vaga em uma maternidade, prejudicaram a concretização do sonho. Depois de 20 anos de espera, ela está grávida de cinco meses. Antes mesmo do parto, percebe que o nascimento de Melinda tem tudo para ser diferente. Entre a chegada do primogênito, João Lucas, e da caçula de Lucélia, estudos realizados em todo o mundo mostraram que os primeiros anos de vida de uma criança são determinantes para o desenvolvimento saudável de um indivíduo.

Lucélia descobriu a importância de estimular a filha, mesmo antes do parto, em rodas de conversa da Unidade de Saúde da Família (USF) Byron Sarinho, da Prefeitura do Recife, na comunidade Sítio das Palmeiras, no bairro do Cordeiro, onde mora. Só teve acesso às informações porque a cidade em que vive também compreendeu que o investimento na primeira infância – período de 0 a 6 anos de vida, fundamental para o desenvolvimento integral infantil – tem impacto no crescimento cognitivo e nas habilidades sociais das crianças, na saúde futura delas, na economia local e até nos índices de violência.

O cérebro humano começa a se formar no 18º dia da gestação, e 90% de todas as conexões cerebrais são estabelecidas até os seis anos de vida. Isso significa que, se a criança for negligenciada, muitas ligações entre os neurônios deixam de acontecer, o que pode afetar o potencial de aprender e crescer. O desenvolvimento é contínuo e engloba diversos processos biológicos e socioemocionais que se formam a partir das experiências vivenciadas especialmente na primeiríssima infância, fase que vai até os três anos. “É um período em que conexão neural acontece em uma velocidade de até mil ligações por segundo. Isso forma uma base para o aprendizado ao longo de toda a vida”, explica a enfermeira, doutora em saúde pública e professora da Universidade de São Paulo (USP) Anna Maria Chiesa.

O estímulo à criança, portanto, deve começar ainda na gestação. “No último trimestre da gravidez, o cérebro e áreas como a audição já estão bem desenvolvidos. A criança já é capaz de ser estimulada pela interação responsiva com o adulto”, acrescenta o diretor de Conhecimento Aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Eduardo Marino.
 
10 investimentos para serem feitos na primeira infância

1 - Pré-natal
6 é o número mínimo de consultas recomendado pelo Ministério da Saúde, com intervalos que não devem passar de 8 semanas entre elas.

2 - Tempo com a família
Mais tempo com os pais pode reduzir em 5% a taxa de evasão escolar em famílias em situação de vulnerabilidade social e 3% nas mais ricas.

3 - Licença maternidade e paternidade
Aumento da licença paternidade para 20 dias implica em 0,009% da arrecadação federal e pode aumentar em 50% a presença deles nas tarefas.

4 - Amamentação
O aleitamento materno por seis ou mais meses do bebê gera um aumento de 20% a 30% na parte do cérebro responsável pela rapidez. das sinapses

5 - Políticas públicas para a famílias
Acompanhamento domiciliar e atendimento à saúde ajudam crianças que vivem em ambientes desprotegidos.

6 - Autonomia ou brincar
A brincadeira deve ser considerada uma das atividades mais importantes da vida da criança, pois a partir dela a criança constrói suas percepções.

7 - Apoio às famílias e cuidadores
Investir na melhoria das habilidades dos pais e cuidadores pode garantir um bom desenvolvimento das crianças nos primeiros anos de vida.

8 - Creches e pré-escola
Frequentar boas creches e pré-escolas melhora o desempenho escolar ao longo da vida, acelera a capacidade cognitiva e aumenta o QI.

9 - Estímulo e vínculo
A ampliação do vínculo afetivo com os pais e cuidadores contribui para que as crianças se sintam seguras para construir seu caminho e ter autonomia.

10 - Infraestrutura urbana
A mobilidade ativa infantil é considerada o futuro das cidades do século 21, como um projeto de uso e ocupação dos espaços públicos.