ESPECIAL GENERAL ABREU E LIMA » Socialismo e o ser cristão Abreu e Lima foi o primeiro a escrever sobre esse tema no Brasil e seus escritos se tornaram referência para o estudo

Monique Santana de Oliveira Sousa
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Publicação: 14/09/2019 03:00

O General Abreu e Lima ficou conhecido como “General das Massas” devido à peça A Rusga da Praia Grande ou o Quixotismo do General das Massas, escrita pelo Cônego Januário da Cunha Barbosa na tentativa de depreciar sua imagem por conta da trajetória nas guerras pela independência hispânica junto a Simon Bolívar. O apelido acabou se tornando sua alcunha, uma vez que Abreu e Lima afirmava o apelido pejorativo e dizia que de fato era General das Massas, pois “a sua causa era pelo povo”.

Depois de tantas polêmicas pelos seus escritos: brigas familiares, acusação de plágio, prisão, perseguição política, debate, conflitos e degradação da imagem nos jornais, exílio em Fernando de Noronha devido aos acontecimentos da Praieira em 1848, o General dedicava-se a um novo estudo: o socialismo!

No jornal A Barca de São Pedro é possível ver os rascunhos iniciais do projeto de uma nação ideal pautada pelas ideias socialistas, que se tornariam, alguns anos depois, uma das obras mais importantes do General Abreu e Lima: O Socialismo,  publicado pela Tipografia Universal de Recife, em 1855, todavia, o General começou a escrevê-lo em 1852. A obra é dividida em 26 capítulos, nos quais ele busca desde definir sua perspectiva e estudo sobre o socialismo, contestando outros pensadores que o antecederam, até fornecer uma explicação com base nas raízes filosóficas, cristã e histórica.

Abreu e Lima foi o primeiro a escrever sobre o socialismo no Brasil, apesar de suas ideias serem consideradas como um socialismo utópico, sua obra é referência ao estudo desse conceito.

Diferentemente do que entendemos hoje por socialismo; das múltiplas aplicações ideológicas do conceito; e dos usos e abusos da semântica; o Socialismo de Abreu e Lima era um socialismo cristão. Segundo ele o socialismo não era uma ideia, uma ciência, uma doutrina ou uma religião, mas sim “um designo da Providência” que tem por objetivo formar “uma só e imensa família”.

Ainda na Barca de São Pedro quando escreveu o artigo “Triunfo das Ideias Socialistas”, defendia que o socialismo era algo pautado apenas para as necessidades e estruturas do país, não se alinhava às teorias do comunismo de Saint Simon ou de Fourier, teóricos do socialismo moderno. Os escritos de Abreu e Lima acerca das ideias socialistas se aproximam do seu discurso no artigo “Colonização que convém ao Brasil”, ambos propõem uma colonização interna, ou seja, a modernização do país de dentro para fora, investindo em seu capital e dinamizando as suas relações com o trabalho em vias internas, criando a sociedade com “os próprios filhos do país”.

O socialismo seria alcançado através do progresso e bem-estar moral e material da sociedade, logo o homem sofreria todas as mazelas para que se alcançasse a reabilitação: a dominação, o fanatismo religioso, a desigualdade, a vaidade, a inveja, que são fenômenos do seu livre arbítrio e, portanto, deveriam ser superados.

Abreu e Lima criticava a ideia de semelhança entre o comunismo e o socialismo, segundo ele o comunismo atacaria a família e a propriedade, são elas e o trabalho, em sua opinião, que conduzem o homem ao desenvolvimento e a civilização e acabava por manchar a boa imagem do socialismo tal como a igreja fez com a filosofia, tornando-a algo depreciativo.

Era contrário também às ideias de Thomas Hobbes, que o homem estava em um “estado de natureza”. Segundo o General, o homem não é um ser selvagem e o “estado de natureza” é contrário à razão, logo, o homem seria um ser “eminentemente social”; o homem não nasce “imperfeito” ou “culpado”, visto que ele foi uma criação divina.

O povo a partir do domínio de consciência passa a desejar participar da vida civil e política e, para tanto, se iniciam os conflitos contra as classes privilegiadas, e assim chegava ao fim o patriarcado.

Para Abreu e Lima o socialismo era uma missão divina, o inicio do chamado “designo da Providência”, que está pautado no livro bíblico de Gêneses capítulo primeiro: “Deus os abençoou e disse; crescei e multiplicai-vos e enchei a terra e sujeitai-a, e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu e sobre todos os animais, que se movem sobre a terra”.

A pauta do socialismo de Abreu e Lima é a ideia de regeneração e reabilitação da forma perfeita do gênero humano, que seria feita pelo próprio homem, no caso a sociedade, visto que o homem, segundo ele, não é um indivíduo e sim um ser coletivo, criado por Deus. Todavia, com a sua liberdade, suas escolhas e sofrimentos individuais, os quais eram necessários, pois a reabilitação se dava pela via das provações, porém a partir da busca pelo bem-estar, no caso um bem estar moral e material, o homem alcançaria a felicidade e a paz de espírito, acentuava ainda que o homem era cidadão do mundo e que o melhor governo não era o monárquico, o republicano, democrático ou nenhum outro, mas sim aquele que proporcionasse “a felicidade, a grandeza, a riqueza e o bem-estar do povo”.