Agora é oficial: estresse deixa cabelos brancos Pesquisadores descobriram que a raiz do problema está numa alteração de células ligadas ao sistema nervoso simpático

Publicação: 25/01/2020 03:00

O embranquecimento do cabelo é um processo natural, associado ao envelhecimento, quando a produção de melanina começa a se tornar deficiente. Porém, em algumas pessoas, parece ocorrer antes do tempo, especialmente nos casos em que os fios brancos se multiplicam após um período de estresse. Um estudo com a participação de um pesquisador brasileiro desvenda mecanismos biológicos do fenômeno e mostra que é possível revertê-lo. O artigo, publicado na revista Nature, não propõe a “cura” dos grisalhos, mas, sim, as bases científicas de mais um dano provocado por estímulos desgastantes.

“Todo mundo tem uma anedota para compartilhar sobre como o estresse afeta seu corpo, principalmente na pele e no cabelo, os únicos tecidos do organismo que podemos ver de fora”, diz a autora sênior, Ya-Chieh Hsu, professora de biologia celular e regenerativa da Universidade de Harvard. Um caso clássico citado por ela (que, provavelmente, não passa de lenda com algum fundo de verdade) é o de Maria Antonieta, que teria ficado com os cabelos completamente brancos na véspera de ser guilhotinada.

“Queríamos entender se essa conexão é verdadeira e, em caso afirmativo, como o estresse leva a alterações em diversos tecidos. A pigmentação capilar é um sistema muito acessível para pesquisar, e estávamos genuinamente curiosos para ver se o estresse realmente leva a cabelos grisalhos.”

Já o brasileiro Thiago Mattar Cunha, do Centro de Pesquisa de Doenças Inflamatórias da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, entrou no estudo sem que seu objetivo inicial fosse desvendar se o estresse está associado ao embranquecimento do cabelo. Financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, a linha de pesquisas de Cunha concentra-se na dor crônica. Um dos experimentos consistia em provocar um estímulo descrito por ele como extremamente doloroso em camundongos.

“A pelagem dos animais era negra e ficou clara depois de passarem por um estresse intenso. Não estávamos esperando por isso”, conta o pesquisador. A alteração na cor foi percebida quatro semanas depois da injeção da substância resiniferatoxina, aplicada nos camundongos para ativar um receptor localizado nas fibras nervosas sensoriais e, assim, provocar a dor. O experimento, então, foi repetido algumas vezes — agora, com objetivo de verificar a associação entre estresse e embranquecimento. Cunha afirma que nos camundongos submetidos a estímulos dolorosos mais brandos, os pelos clarearam, mas nem tanto: “Foi completamente diferente”.

Em prontidão
Segundo o pesquisador, a explicação está no sistema nervoso simpático, que rege a resposta diante de um estímulo de perigo ou dor. Quando estimulado, aciona uma cadeia de reações, colocando o organismo em prontidão. Uma dessas ações é a liberação de adrenalina e cortisol — substâncias essenciais para mecanismos de defesa, que em excesso são prejudiciais, afetando negativamente o corpo como um todo.

Cunha descobriu por acaso que um grupo de pesquisadores da Universidade de Harvard, onde ele atuou como professor visitante até o ano passado, havia feito achados semelhantes à dos cientistas de São Paulo. Assim, ele foi convidado por Ya-Chieh Hsu para participar do estudo que a bióloga vinha conduzindo.

Os 5 passos do embranquecimento
  1. No bulbo capilar, há um reservatório de células-tronco produtoras de pigmento

  2. Quando há degeneração do fio, essas estruturas especializam-se na fabricação de melanina

  3. Sob estresse, os nervos simpáticos liberam a noradrenalina, que é absorvida pelas células-tronco regeneradoras de pigmentos

  4. Todas as células se convertem em produtoras de melanina, esgotando o reservatório antes do tempo

  5. O cabelo torna-se branco prematuramente e, pelo menos atualmente, de forma irreversível