Um monumento de fé para São João Batista Em Exu, no Sertão do Araripe, a igreja em homenagem ao santo padroeiro foi construída há 150 anos e teve a sua inauguração noticiada pelo Diario de Pernambuco

Jailson da Paz
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Publicação: 14/07/2018 03:00

No dia 1 de setembro de 1868, o Diario de Pernambuco noticiou a inauguração de uma capela no Araripe. A publicação aconteceu, como era comum na época, depois do fato ocorrer. Dois meses e uma semana separam uma da outra. O padroeiro, São João Batista, foi colocado no altar da capela em 23 de junho e a primeira missa – cantada e concelebrada por quatro padres – se deu no dia seguinte. Começava a tradição religiosa de um dos templos mais conhecidos do semiárido pernambucano, que alinhava, conforme Thereza Oldam de Alencar, uma história familiar e um dos momentos emblemáticos da epidemia de cólera na região. Thereza conta isso no livro Igreja de São João Batista do Araripe – Exu-PE, Sesquicentenário 1868-2018, lançado recentemente.

A igreja, segundo a autora, é monumento de fé e de agradecimento a Deus. “É pagamento de uma promessa”, escreve a autora. A promessa partiu do Barão de Exu, título concedido a Gualter Martiniano de Alencar Araripe. Conta Thereza que o barão, ainda jovem, preocupado com o alastramento da cólera, apelou para que São João Batista concedesse a graça da doença não atingir sua família e o lugar onde moravam. Em troca, caso fosse atendido, ergueria uma igreja em homenagem ao santo e o festejaria antes do templo ser concluído. O Araripe enfrentava uma epidemia de cólera na época. O foco iniciado em 1862, no Crato, durou até 1864. Em noventa dias, em 1862, após o registro da primeira morte por cólera, uma das doenças mais temidas do século 19, na cidade cearense, a região contabilizou 1,2 mil mortes. Nenhuma delas, em Exu.

Pedido feito, pedido atendido. O Barão de Exu começou as obras. “Contratou em Fortaleza pessoal especializado na construção de igrejas, e, segundo a tradição familiar, também na Corte, certamente para a construção do teto”, afirma a autora, nascida em Exu e doutora em Letras. Para cumprir a promessa, o barão reservou três contos de réis. Era, diz Thereza, “uma pequena fortuna para a época”, considerando-se que o material necessário para a construção veio da Fazenda Araripe, de propriedade do barão, e a mão de obra era de escravos e voluntários. Meses após o início, o templo estava pronto. As paredes mediam aproximadamente um metro de espessura, as portas e as janelas eram em madeira de lei, a cobertura fora armada com 32 duas tesouras de madeira entrelaçadas, cobrindo um vão livre de 8,5 metros, além de um coro. No piso, tijolos de barro queimado e maciço.

Apesar do cuidado com a obra, o Barão de Exu (1822-1889) não deixou documentos sobre a data do início da construção. Sinais de respeito à tradição de se ter uma pedra fundamental, marco do começo de obras importantes, também nunca foram encontrados no templo, considerado pela Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) uma edificação de relevante interesse arquitetônico. A igreja em estilo colonial fica nas terras que o barão herdou do pai, o capitão mor Luiz Pereira de Alencar Araripe. E o espírito de herança é preservar o templo e os festejos religiosos. Exemplo disso, relata Thereza Oldam de Alencar, está no inventário de Maria Carlina de Alencar Araripe, filha do barão. “A igreja de São João Batista do Araripe foi relacionada, inventariada e partilhada em igualdade de condições entre os oito filhos: Guálter, Canuto, Elisa, Raimunda, José, Elcira, Luiz e Antholiano”. Assim, a filha do barão apontava para cada filho que a ele cabia a responsabilidade de cuidar da igreja e manter o festejo junino.

Promessa

Família Alencar e a inauguração da igreja

  • 1709
    Instalação de Leonel de Alencar Rego no Sítio Cayssara(atual Fazenda Caiçara), em Exu
  • 1760
    Nascimento de Bárbara Pereira de Alencar, na Fazenda Caiçara
  • 1817
    Revolução Pernambucana. Bárbara Alencar proclama a República do Crato
  • 1822
    Nascimento do Barão de Exu, em 18 de junho, na Fazenda Caiçara
  • 1824
    Confederação do Equador. Tristão Gonçalves de Alencar Araripe, filho de Bárbara Alencar, é assassinado como Presidente da Confederação
  • 1842
    Sedição de Exu. Envolvimento do Barão de Exu no movimento pró-maioridade de Dom Pedro de Alcântara
  • 1855
    Primeiro foco da epidemia de cólera que assolou o Crato e aterrorizou Exu
  • 1862
    Novo foco de cólera no Crato, vitimando 1.100 pessoas em 90 dias
  • 1863
    Barão de Exu pede a intercessão de São João Batista, junto a Deus, para livrar Exu da cólera
  • 1864
    A epidemia termina sem que haja mortes em Exu e início da construção da Capela de São João Batista
  • 1868
    Pagamento da promessa do Barão de Exu, com a inauguração da Capela de São João Batista em 23 de junho
Fonte: Livro Igreja de São João Batista do Araripe – Exu-PE, Sesquicentenário 1868-2018, de Thereza Oldam de Alencar