Batuques que vêm do berço Tradições do carnaval passam de geração em geração, formando jovens percussionistas para dar vida longa à folia pernambucana

Publicação: 08/02/2020 03:00

Dona de um par de olhos encantadores, Ágata dos Santos, de três aninhos de idade, é puro charme e presença marcante no corpo de percussionistas do Maracatu Nação Encanto da Alegria, de Casa Amarela. O instrumento que vem nas mãos da pequena é o agbê. A indumentária dela é igualzinha a dos adultos. Ágata nasceu dentro de uma família ligada às tradições do maracatu e desde os quatro meses participa ativamente das atividades do grupo. Ela faz parte de uma geração que tem uma vida inteira dedicada ao carnaval. São famílias unidas pelas diversas manifestações culturais e embaladas pelos clarins de Momo.

De mãe e pai para filhos e filhas, as manifestações culturais nascidas espontaneamente no meio do povo resistem através do canto, no repique dos tamboris, nas fantasias, no rufar dos tambores, na suavidade dos flabelos. Este é o segundo ano que Ágata participa das apresentações e não poderia ser diferente. A miúda é filha de percussionistas do Nação Encanto da Alegria e afilhada do Mestre do Maracatu, Felipe Tavares. Além disso, conta com três primos que também fazem parte do grupo tocando alfaia, entre eles Pedro Henrique dos Santos, o Pedrinho.

Com as raízes fincadas no maracatu, Pedrinho é filho do Mestre Felipe e de Thamyryes Lira dos Santos, também percussionista. No carnaval, a mãe tem a missão de carregar a Bruxa, uma calunga trazida pelos Maracatus de Nação com mais de 10 anos de existência, caso do Encanto da Alegria, que soma 21 anos. “Durante a minha gravidez Pedrinho já estava na avenida com gente. Depois disso, ainda muito pequeno, ele já batucava nas bacias dentro de casa. Ele via o pai tocando e queria tocar também. Aos dois anos ele começou a tocar alfaia e de lá pra cá ele também aprendeu a tocar maraca. Mas a alfaia é o xodó”, explica a mãe.

Outro caso de herança que vem desde a barriga é o de Ana Benedita e da filha Yialodê da Costa, 10 anos. “O candomblé faz parte da minha vida há muitos anos e antes mesmo de Yialodê nascer ela participava do afoxé dentro da minha barriga”. De um dialeto de matriz africana, Yialodê é um título dado para algumas mulheres dos terreiros de Nação Nagô e significa “o poder feminino”.

Emponderada, Yialodê divide espaço com a mãe no corpo de baile do Afoxé Oyá Tokolê, de Dois Unidos, além de uma tia e duas primas. Há quatro anos ela integra o afoxé e sempre fez questão de usar as mesmas roupas e adereços das companheiras bailarinas.

Da Bomba do Hemetério vem a Gigantes do Samba. Aos 11 anos, Davi Henrique dos Santos faz parte da Baterim Mirim da agremiação. Filho do ritmista Arnaldo dos Santos, que cresceu dentro da escola, Davi toca tamborim e a rotina de ensaios se repete, nesta época do ano, nas  terças e sábados.  “Muitos ritmistas que tocam hoje na bateria adulto da Gigantes veio da mirim. E ter meu filho envolvido é muito importante. O samba forma artistas em diversas áreas e faz também a parte social. Já vi o samba tirar muita gente das ruas” explica Arnaldo, que há mais de 20 anos se dedica à escola.

Os blocos líricos também são abraçados pelas crianças. Esse é o caso do bloco de pau e corda O Bonde. Nascido na Imbiribeira e com quase 30 anos de existência, o bloco agora também tem a versão infantil: O Bondinho.

“É muito importante passar essa riqueza que temos aos mais novos. Ultrapassar gerações e deixar nosso legado, sem dúvida é uma das maiores contribuições”, explica Cid Cavalcanti, presidente e fundador. O Bondinho existe há três anos e desde o primeiro ano os irmãos João Pedro Almeida, 10, e Juan Lucas, 4, são presença certa nos desfiles infantil. Os pequenos são netos de Janeide Almeida Pinheiro, que há seis anos integra a versão adulta do bloco com raízes na Imbiribeira.